Páginas

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Descartes: Método






Descartes

 O Método



O que é o Método?


«Entendo por método regras certas e fáceis, que permitem a quem exatamente as observar nunca tomar por verdadeiro algo de falso e, sem desperdiçar inutilmente nenhum esforço da mente, mas aumentando sempre gradualmente o saber, atingir o conhecimento verdadeiro de tudo o que será capaz de saber. 
Aqui, há duas observações a fazer: não tomar absolutamente nada de falso por verdadeiro, e chegar ao conhecimento de tudo. Com efeito, se ignorarmos algo de quanto podemos saber é apenas porque ou nunca divisamos uma via que nos conduzisse a tal conhecimento, ou porque caímos no erro oposto. Mas se o método nos dá uma explicação perfeita do uso da intuição intelectual para não cairmos no erro contrário à verdade, e do meio de encontrar deduções para chegar ao conhecimento de tudo, parece-me que nada mais se exige para ele ser completo, já que nenhuma ciência se pode adquirir a não ser pela intuição intelectual ou pela dedução, como antes ficou dito.»


René Descartes, Regras para a Direção do Espírito,
 Lisboa, Edições 70, p. 8.


O que pretende Descartes com o seu método?


"Assim, o meu desígnio não é ensinar aqui o método que cada qual deve seguir para bem conduzir sua razão, mas apenas mostrar de que maneira me esforcei por conduzir a minha. Os que se metem a dar preceitos devem considerar-se mais hábeis do que aqueles a quem as dão; e, se falham na menor coisa, são por isso censuráveis. Mas, não propondo este escrito senão como uma história, ou, se o preferirdes, como uma fábula, na qual, entre alguns exemplos que se podem imitar, se encontrarão talvez também muitos outros que se terá razão de não seguir, espero que ele será útil a alguns, sem ser nocivo a ninguém, e que todos me serão gratos por minha franqueza".



"Mas, o que me contentava mais nesse método era o fato de que, por ele, estava seguro de usar em tudo minha razão, se não perfeitamente, ao menos o melhor que eu pudesse; além disso, sentia, ao praticá-lo, que meu espírito se acostumava pouco a pouco a conceber mais nítida e distintamente seus objetos, e que, não o tendo submetido a qualquer matéria particular, prometia a mim mesmo aplicá-lo tão utilmente às dificuldades das outras ciências como o fizera com as da Álgebra. Não que, para tanto, ousasse empreender primeiramente o exame de todas as que se me apresentassem, pois isso mesmo seria contrário à ordem que ele prescreve. Porém, tendo notado que os seus princípios deviam ser todos tomados à Filosofia, na qual não encontrava ainda quaisquer que fossem certos, pensei que seria mister, antes de tudo, procurar ali estabelecê-los; e que, sendo isso a coisa mais importante do mundo, e onde a precipitação e a prevenção eram mais de recear, não devia empreender sua realização antes de atingir uma idade bem mais madura do que a dos vinte e três anos que eu então contava e antes de ter despendido muito tempo em preparar-me para isso, tanto desenraizando de meu espírito todas as más opiniões que nele acolhera até essa época como acumulando muitas experiências, para servirem em seguida de matéria aos meus raciocínios, e exercitando-me sempre no método que me prescrevera, a fim de me firmar nele cada vez mais".



Qual a inspiração do Método?


"Eu estudara um pouco, sendo mais jovem, entre as partes da Filosofia, a Lógica, e, entre as Matemáticas, a Análise dos geômetras e a Álgebra, três artes ou ciências que pareciam dever contribuir com algo para o meu desígnio. Mas, examinando-as, notei que, quanto à Lógica, os seus silogismos e a maior parte de seus outros preceitos servem mais para explicar a outrem as coisas já se sabem, ou mesmo, como a arte de Lúlio, para falar, sem julgamento, daquelas que se ignoram, do que para aprendê-las. E embora ela contenha, com efeito, uma porção de preceitos muito verdadeiros e muito bons, há todavia tantos outros misturados de permeio que são ou nocivos, ou supérfluos, que é quase tão difícil separá-los quanto tirar uma Diana ou uma Minerva de um bloco de mármore que nem sequer está esboçado. Depois, com respeito à Análise dos Antigos e à Álgebra dos modernos, além de se estenderem apenas a matérias muito abstratas, e de não parecerem de nenhum uso, a primeira permanece sempre tão adstrita à consideração das figuras que não pode exercitar o entendimento sem fatigar muito a imaginação; e esteve-se de tal forma sujeito, na segunda, a certas regras e certas cifras, que se fez dela uma arte confusa e obscura que embaraça o espírito, em lugar de uma ciência que o cultiva. Por esta causa, pensei ser mister procurar algum outro método que, compreendendo as vantagens desses três, fosse isento de seus defeitos. E, como a multidão de leis fornece amiúde escusas aos vícios, de modo que um Estado é bem melhor dirigido quando, tendo embora muito poucas, são estritamente cumpridas; assim, em vez desse grande número de preceitos de que se compõe a Lógica, julguei que me bastariam os quatro seguintes, desde que tomasse a firme e constante resolução de não deixar uma só vez de observá-los".


Discurso do Método



Quais as regras do Método?



O primeiro era o de jamais acolher alguma coisa como verdadeira que eu não conhecesse evidentemente como tal; isto é, de evitar cuidadosamente a precipitação e a prevenção e de nada incluir em meus juízos que não se apresentasse tão clara e tão distintament a meu espírito, que eu não tivesse nenhuma ocasião de pô-lo em dúvida.

O segundo, o de dividir cada uma das dificuldades que eu examinasse em tantas parcelas quantas possíveis e quantas necessárias fossem para melhor resolvê-las[24].

O terceiro, o de conduzir por ordem meus pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis de conhecer, para subir, pouco a pouco, como por degraus, até o conhecimento dos mais compostos, e supondo mesmo uma ordem entre os que não se precedem naturalmente uns aos outros.

E o último, o de fazer em toda parte enumerações tão completas e revisões tão gerais, que eu tivesse a certeza de nada omitir.


Essas longas cadeias de razões, todas simples e fáceis, de que os geômetras costumam servir-se para chegar às suas mais difíceis demonstrações, haviam-me dado ocasião de imaginar que todas as coisas possíveis de cair sob o conhecimento dos homens seguem-se umas às outras da mesma maneira e que, contanto que nos abstenhamos somente de aceitar por verdadeira qualquer que não o seja, e que guardemos sempre a ordem necessária |39 para deduzi-las umas das outras, não pode haver quaisquer tão afastadas a que não se chegue por fim, nem tão ocultas que não se descubram. 




                                             Lola



Sem comentários:

Enviar um comentário