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quarta-feira, 21 de junho de 2023

Retenções: sim ou não?



Retenções: sim ou não?


Porque sou a favor das retenções

Como se sentirá um aluno que chega ao 3.º ano e é o único de 20 que ainda não lê? Que autoestima terá quando olhar para o lado e se confrontar com o conhecimento bem mais evoluído dos colegas?

No passado dia 1 de junho, a colega Alexandra Silva escreveu um artigo, aqui no Observador, onde explicava porque era contra a retenção de alunos. Discordando eu dessa opinião, tentarei explicar, nas próximas linhas, as razões pelas quais sou a favor das retenções.

A retenção de alunos é um tema polémico na área da educação, com defensores e críticos, geralmente, fervorosos. No entanto, gostaria de apresentar a minha visão como alguém que acredita que a retenção pode trazer benefícios significativos para o desenvolvimento educativo dos estudantes. Ao afastar o facilitismo da escola e valorizar o rigor, a exigência, a cultura do esforço e do empenho, podemos proporcionar uma base sólida para o sucesso académico e pessoal dos alunos, em qualquer ano escolar.

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Defender a retenção não é um ato de maldade ou insensibilidade, significa, na realidade, reconhecer e valorizar o mérito e o esforço dos alunos. A retenção, quando aplicada com critérios claros, pode premiar aqueles que se dedicam e se empenham nos estudos, motivando-os a continuar a procurar o sucesso académico.

Para além disso, também ajuda a combater o facilitismo, um problema cada vez mais recorrente nas escolas públicas portuguesas. A promoção quase automática de alunos sem a devida aquisição de conhecimentos, mascarada de medidas de suporte à aprendizagem, contribui para a desvalorização do ensino e prejudica a formação de indivíduos aptos para o mercado de trabalho e para a sociedade.

A retenção pode proporcionar aos alunos uma oportunidade de desenvolver habilidades socioemocionais, como resiliência, perseverança e responsabilidade. A experiência de enfrentar desafios académicos e superá-los pode fortalecer o caráter dos estudantes, preparando-os para os obstáculos futuros. As dificuldades não se combatem com a diminuição dos obstáculos, mas sim com ajuda para os conseguir transpor.

Ao reter alunos, as escolas podem e devem oferecer um ensino mais personalizado, adaptado às necessidades individuais de cada estudante. A chamada personalização do ensino é essencial para garantir que todos os alunos alcancem o seu potencial máximo, permitindo-lhes progredir de acordo com o seu ritmo de aprendizagem. Respeitar o ritmo de aprendizagem é exatamente aceitar que determinado aluno possa não estar academicamente preparado para transitar de ano e nessa altura a sua passagem pode ser mais prejudicial do que benéfica. Como se sentirá um aluno que chega ao 3.º ano e é o único de 20 que ainda não lê? Se há quem defenda que reter pode traumatizar, eu defendo que transitá-lo sem conhecimentos traumatiza muito mais. Que autoestima terá este aluno quando olhar para o lado e se confrontar com o conhecimento bem mais evoluído dos colegas?

Por essa razão considero que a retenção de alunos permite que eles adquiram uma base sólida antes de avançarem para o próximo ano escolar, sendo que essa é essencial para o sucesso contínuo dos alunos, evitando lacunas de conhecimento que podem comprometer o seu desempenho académico ao longo da escolaridade. Quantos de nós já não ouvimos os colegas, até do ensino superior, queixarem-se de que os alunos chegam cada vez mais mal preparados? Não é legítimo fazer uma ligação direta com o facto de as retenções serem apenas possíveis em casos excecionais, conforme consta na atual lei?

A transição automática desvaloriza a importância do processo de aprendizagem e não apenas do resultado final. O foco no esforço contínuo e na aquisição efetiva de conhecimentos é fundamental para o desenvolvimento intelectual dos alunos, tornando-os estudantes críticos e autónomos. Não deveria ser esse um dos propósitos da escola?

A escola tem a obrigação social de garantir que determinado sujeito, a quem dá a certificação, adquiriu verdadeiramente o conhecimento e as capacidades que era suposto ter adquirido ao longo da sua frequência escolar. Certificando sem essa garantia é mentir à sociedade e não cumprir com o seu propósito!

Ao tomar a decisão de reter um aluno, é necessário envolver os pais e responsáveis, criando um diálogo aberto e construtivo para apoiar o desenvolvimento académico e pessoal do estudante.

A retenção promove uma cultura de exigência e responsabilidade, tanto por parte dos alunos quanto dos professores. Por essa razão é essencial estabelecer padrões elevados de desempenho e responsabilizar os alunos pela sua própria aprendizagem, incentivando-os a superar os desafios e a alcançar metas graduais e cada vez mais altas.

Por fim, a retenção prepara os alunos para os desafios da vida adulta. A escola tem a responsabilidade de formar cidadãos competentes e preparados para os desafios da sociedade. Ao valorizar o rigor, a exigência e o empenho, a retenção contribui para a formação de indivíduos capazes de enfrentar os obstáculos da vida com resiliência e determinação.

 

In OBSERVADOR

Alberto Veronesi (professor do 1º ciclo)

06 jun. 2023, 00:121

 

 

Porque sou contra a retenção de alunos

Vista muitas vezes como medida necessária para garantir a qualidade de ensino e o desenvolvimento das aprendizagens, a prática de chumbar de ano assoma-se mais como medida punitiva.

Se, aos 15 anos, um aluno está no 3.º ciclo e já conta com três retenções escolares, todo o sistema educativo, social e familiar teve de falhar. Um aluno com este percurso escolar é, certamente, um Soldadinho a quem não foi feita uma perna, por falta de chumbo, como na famosa história de Hans Christian Andersen.

A retenção de alunos em anos que não sejam os de final de ciclo está regulamentada e deve fazer-se apenas “a título excecional”. Apesar de nós professores termos isto em mente, o debate sobre chumbar ou não certos alunos – que não desenvolveram aprendizagens, faltaram às aulas, não apresentaram materiais necessários, tiveram comportamentos incorretos, entre outros – volta a surgir à medida que nos aproximamos do final de ano letivo. Se para os finais de ciclo as regras são explícitas (e com o regresso dos exames finais de 9.º de Português e Matemática a contar), nos outros anos as contas podem ficar mais complicadas. Transitamos alunos com sete níveis inferiores a três e outros com apenas quatro níveis inferiores a três ficam retidos.

Então o que estamos a avaliar?

Domingos Fernandes tem desenvolvido amplo trabalho nesta área e procurado distinguir avaliação pedagógica, classificação e notas, sustentando a importância e diferença da avaliação formativa (avaliação para as aprendizagens) e da avaliação sumativa (avaliação das aprendizagens). Prendo-me naquilo a que vulgarmente chamamos “as notas” de final de ano letivo e que podem decidir o futuro académico de um aluno. Nesse valor reflete-se o conhecimento adquirido e as competências desenvolvidas pelos estudantes. Ora, se um aluno não atingiu esses requisitos mínimos, a transição automática dá ideia de facilitismo, aceitação da mediocridade ou mesmo de um plano economicista do Governo.

Não o considero. De acordo com vários investigadores os efeitos da não transição de ano letivo em pouco ou nada favorecem o desempenho académico dos alunos no futuro. Pelo contrário. O estudo Reviews of School Resources: Portugal 2018 mostrava que cerca de 34% dos alunos de 15 anos chumbaram pelo menos um ano, quase três vezes mais que a média da OCDE (12%) e que um dos seus principais impactos era o abandono escolar precoce. Outros estudos internacionais confirmam também que chumbar de ano, em Portugal, é um fator fortemente influenciado pelo estatuto socioeconómico do aluno. De acordo com o PISA 2015, mais de 50% dos alunos de 15 anos de meios carenciados repetem pelo menos uma vez de ano. Reiteram ainda que alunos oriundos de contextos desfavorecidos têm uma probabilidade quatro vezes superior de ficar retidos. E que os impactos psicológicos, anímicos e relacionais são brutais, comparáveis até com algo como a perda dos pais.

Moral da história. Vista muitas vezes como medida necessária para garantir a qualidade de ensino e o desenvolvimento das aprendizagens, a prática de chumbar de ano assoma-se mais como medida punitiva (“eu bem vos andei a avisar” – quem nunca disse?). Revela problemas de um sistema educativo que começam no pré-escolar e que se vão acumulando ao longo de anos de passagem por ambientes pouco propícios à aprendizagem (familiares e/ou escolares). É um mecanismo promotor de maus-tratos tantas vezes já existentes (“se chumbar, dou-lhe uma sova” – quem nunca ouviu?). Encobrem processos de avaliação que podem ser injustos e subjetivos, pois os referenciais e instrumentos de avaliação variam entre instituições de ensino, escolas e mesmo de turma para turma, consoante os professores.

Não defendo o chumbo, reprovação, retenção, não transição, como lhe queiramos chamar, como estratégia de aprendizagem. Só um ensino mais focado no aluno, personalizado, com programas de recuperação contínua, de modo a permitir que os estudantes avancem gradualmente, sem a punição de chumbar de ano. Defendo o direito a uma Educação de qualidade, que deve ser de acesso livre, equitativo, e que conduza a resultados de aprendizagem relevantes e eficazes, como reforça um dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. Só assim, creio, a Escola pode auxiliar os que fizeram o caminho sem uma perna a não se atirarem para a fogueira. O teste adaptado não basta e a inclusão é para todos.

In OBSERVADOR

Alexandra silva

Professora do 3.º Ciclo e Secundário

01 jun. 2023, 00:121



LOLA

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