Discurso de Barack Obama no Cairo – Egipto
Sinto-me honrado, nessa milenar cidade do Cairo, recebido por duas importantes instituições. Há mais de mil anos, a Universidade de al-Azhar já era sentinela avançada dos estudos islâmicos, e por mais de um século a Universidade do Cairo é fonte de desenvolvimento do Egito. Juntas, essas instituições representam a harmonia entre a tradição e o progresso. Agradeço a hospitalidade dessas universidades e a hospitalidade do povo egípcio. Trago-lhes com orgulho a boa-vontade do povo americano, e um voto de paz das comunidades muçulmanas em meu país: assalaamu alaykum[1].
Nos reunimos num momento de tensão entre os EUA e muçulmanos em várias partes do mundo – tensão que brota de forças históricas e vão além do atual debate político. As relações entre o Islam e o ocidente incluem séculos de coexistência e cooperação, mas também conflitos e guerras religiosas. Mais recentemente, a tensão foi alimentada pelo colonialismo que nega direitos e oportunidades a muitos muçulmanos, e uma guerra fria na qual países de maioria muçulmana são muitas vezes tratados como fantoches [or. proxies], sem atenção às suas aspirações. Além disso, as rápidas mudanças trazidas pela modernidade e pela globalização levaram muitos muçulmanos a ver o ocidente como hostil às tradições do Islam.
Extremistas violentos exploraram essas tensões em minorias pequenas, mas potentes, de muçulmanos. Os ataques de 11/9/2001 e os continuados esforços daqueles extremistas em ações de violência contra civis, levaram alguns, no meu país, a ver o Islam como inevitavelmente hostil, não só aos EUA e aos países ocidentais, mas hostil também aos direitos humanos. O que alimentou mais medo e desconfiança.
Extremistas violentos exploraram essas tensões em minorias pequenas, mas potentes, de muçulmanos. Os ataques de 11/9/2001 e os continuados esforços daqueles extremistas em ações de violência contra civis, levaram alguns, no meu país, a ver o Islam como inevitavelmente hostil, não só aos EUA e aos países ocidentais, mas hostil também aos direitos humanos. O que alimentou mais medo e desconfiança.
Enquanto nossas relações forem definidas por nossas diferenças, mais força daremos aos que semeiam ódio, não paz; e aos que promovem conflitos, não a cooperação que pode ajudar nosso povo a alcançar justiça e prosperidade. Esse ciclo de suspeitas e discórdia tem de acabar.
Vim até aqui em busca de um recomeço, entre os EUA e os muçulmanos de todo o mundo; recomeço baseado em interesse mútuo e mútuo respeito; e baseado na verdade de que os EUA e o Islam não são exclusivos e não precisam viver em competição. Em vez disso, somam-se e partilham princípios comuns – princípios de justiça e progresso; de tolerância e de respeito à dignidade de todos os seres humanos.
Reconheço que a mudança não pode acontecer da noite para o dia. Nenhum discurso pode pôr fim a anos de desconfiança, nem posso, eu, com meu pouco tempo de governo, ter resposta para todas as complexas questões que nos trouxeram ao ponto em que estamos. Mas estou convencido de que, para andar adiante, temos de falar abertamente o que escondemos nos nossos corações, e, também, o que se diz por trás de portas fechadas. Temos de manter esforço sustentado para nos ouvir, uns os outros; para aprender uns dos outros; para respeitar uns os outros; e para procurar terreno comum. Como ensina o santo Corão: “Sê consciente de Deus e dize sempre a verdade.” É o que tentarei fazer – dizer a verdade, do melhor modo que consiga, sob o peso da enorme tarefa à nossa frente, e firme na minha crença de que os interesses que partilhamos como seres humanos são mais poderosos que as forças que nos mantêm afastados.
Parte dessa convicção tem raízes na minha própria experiência. Sou cristão, mas meu pai é família queniana com várias gerações de muçulmanos. Menino, vivi muitos anos na Indonésia e ouvia o chamamento do azaan [o canto que convoca os muçulmanos para as orações] ao nascer do dia e ao cair da noite. Jovem adulto, trabalhei em comunidades, em Chicago, nas quais muitos encontravam dignidade e paz em sua fé muçulmana.
Na universidade, aluno de história, também conheci civilizações que muito devem ao Islam. Foi o Islam – em lugares como a Universidade al-Azhar – que conduziu a luz do saber ao longo de muitos séculos, pavimentando o caminho para o Renascimento e o Iluminismo europeus. A inovação, em comunidades muçulmanas, desenvolveram a álgebra; a bússola e outros instrumentos de navegação; o manejo dos pincéis e penas e a imprensa; o que sabemos sobre como as doenças disseminam-se e como podem ser curadas. A cultura islâmica deu-nos seus arcos majestosos e as espirais; a poesia eterna e a música; a caligrafia mais elegante e locais de contemplação. E, ao longo da história, o Islam demonstrou por palavras e ações, as possibilidades da tolerância religiosa e da igualdade racial.
Sei, também, que o Islam sempre foi parte da história dos EUA. A primeira nação a reconhecer meu país foi o Marrocos. Ao assinar o Tratado de Trípoli, em 1796, nosso segundo presidente, John Adams, escreveu: “Os EUA não tem, em sim nenhum traço de inimizade contra as leis, a religião ou a tranquilidade dos muçulmanos.” E desde o nascimento dos EUA, os muçulmanos norte-americanos enriqueceram os EUA. Lutaram nossas guerras, serviram ao governo, lutaram pelos direitos civis, empreenderam, iniciaram negócios, ensinaram em nossas universidades, conquistaram medalhas em arenas esportivas, receberam Prêmios Nobel, construíram nossos mais altos arranha-céus e acenderam a tocha Olímpica. Quando o primeiro muçulmano norte-americano foi recentemente eleito para o Congresso, ele jurou defender nossa constituição, sobre o mesmo Santo Corão que um dos pais fundadores dos EUA – Thomas Jefferson – guardava em sua biblioteca pessoal.
Assim conheci o Islam em três continentes, antes de chegar à parte do mundo onde foi revelado. Essa experiência guia minha convicção de que a parceria entre EUA e o Islam tem de basear-se sobre o que é o Islam, não sobre o que ele não é. E entendo como parte de minha responsabilidade como presidente dos EUA lutar contra os estereótipos negativos do Islam, onde apareçam.
Mas esse mesmo princípio deve aplicar-se ao modo como
os muçulmanos vêem os EUA. Assim como os muçulmanos não são um estereótipo,
tampouco os EUA são estereótipo de império que só pensa em seus interesses. Os
EUA têm sido uma das maiores fontes de progresso que o mundo jamais conheceu.
Nascemos de uma revolução contra um império. Fomos fundados sobre o ideal de
que todos são criados iguais, e derramamos sangue e lutamos durante séculos
para dar pleno sentido a essas palavras – dentro de nossas fronteiras e em todo
o mundo. Somos modelados por todas as culturas, chegadas de todos os quadrantes
da Terra, e dedicados a um simples conceito: E pluribus unum – “De muitos,
[fazer] um.”
Muito se disse de um afro-americano, de nome Barack
Hussein Obama, ter sido eleito presidente. Mas minha história pessoal não é
assim tão rara. O sonho da oportunidade para todos os povos ainda não se
concretizou nos EUA, mas a promessa persiste para todos que cheguem às nossas
costas, incluídos os cerca de 7 milhões de muçulmanos norte-americanos que hoje,
nos EUA, gozam de condições de vida e educação superiores à média.
Além disso, a liberdade na América é indivisível da
liberdade de religião. Há uma mesquita em cada estado dos EUA, mais de 1.200
mesquitas em todo o país. Por isso o governo dos EUA foi aos tribunais para
proteger o direito de mulheres e meninas usarem o hijab, e punir os que
tentassem negar-lhes esse direito.
Que não reste nenhuma dúvida: o Islam é parte dos EUA.
E eu acredito que os EUA guardam consigo a verdade segundo a qual, independente
de raça, religião ou idade, todos partilhamos aspirações comuns – viver em paz
e segurança; obter boa educação e trabalhar com dignidade; amar a família, a
comunidade e nosso Deus. Tudo isso todos partilhamos. Essa é a esperança de
toda a humanidade.
Claro, reconhecer nossa humanidade comum é apenas a
primeira de nossas tarefas. Só palavras não bastam para atender às necessidades
de nosso povo. Essas necessidades só serão satisfeitas se agirmos firmemente
nos próximos anos; e se entendermos que os desafios à frente são partilhados e
que se fracassarmos, todos sofreremos.
Já aprendemos, de nossa experiência recente, que
quando um sistema financeiro enfraquece, num país, a prosperidade de todos
sofre, em todos os lugares. Quando uma gripe faz adoecer um ser humano, todos
ficamos ameaçados. Quando uma nação trabalha para construir uma arma nuclear, o
risco de ataques nucleares aumenta para todos os povos. Quando um extremista
violento opera num desfiladeiro nas montanhas, há pessoas ameaçadas do outro
lado do oceano. E quando inocentes são massacrados na Bósnia e Darfur, a mancha
se alastra por toda nossa consciência coletiva. Isso é o que significa
partilhar o mundo, no século 21. Essa é a responsabilidade que todos temos, uns
com os outros, como seres humanos.
É uma responsabilidade difícil de assumir. A história
humana tem sido, muitas vezes, história de nações e tribos que subjugam umas as
outras para atender interesses que não são de todos. Nos novos tempos que
vivemos, essas atitudes são de auto-derrota. Dada nossa interdependência,
qualquer ordem mundial que ponha uma nação ou um povo acima dos demais,
fracassará inevitavelmente. Assim, pensemos o que pensarmos do passado, não
podemos ficar prisioneiros do passado. Nossos problemas têm de ser equacionados
em espírito de parceria; temos de partilhar o progresso.
Isso não implica que se devam ignorar as fontes de
tensão. De fato, sugere o contrário disso: temos de encarar abertamente essas
tensões. Assim, nesse espírito, permitam que eu fale clara e abertamente sobre
algumas questões que creio que temos de enfrentar juntos.
A primeira dessas questões que temos de enfrentar é o
extremismo violento, em todas as suas formas.
Em Ankara, deixei claro que os EUA não estão – e
jamais estarão – em guerra contra o Islam. Mas enfrentaremos sem descanso todos
os extremistas violentos que ameacem nossa segurança. Porque rejeitamos o que
homens e mulheres de todas as fés rejeitam: a morte de inocentes, homens,
mulheres e crianças. E meu primeiro dever como presidente é proteger os
norte-americanos.
A situação no Afeganistão demonstra os objetivos dos
EUA e a necessidade de que todos trabalhemos juntos. Há mais de sete anos os
EUA lutam contra a al-Qaida e os Taliban com amplo apoio internacional. Lá não
estamos por escolha nossa; fomos para lá por necessidade. Sei que há quem
questione e quem justifique os eventos do 11/9. Mas sejamos claros: a al-Qaida
matou cerca de 3.000 pessoas, naquele dia. As vítimas foram homens, mulheres e
crianças norte-americanas e de outras nações, inocentes, que jamais haviam
feito mal a alguém. Mesmo assim, a al-Qaida escolher assassinar aquelas
pessoas, assumiu a autoria do ataque e ainda hoje afirma sua determinação de
matar outra vez em escala massiva. Eles têm braços em vários países e tentam
ampliar sua área de alcance. Nada disso são especulações. Esses são fatos a
serem enfrentados.
Que ninguém se engane: não desejamos manter nossas
tropas no Afeganistão. Não queremos instalar bases lá. É agonia, para os EUA
ver morrer nossos jovens, homens e mulheres. Esse conflito custa-nos muito e é
politicamente difícil continuar aquela luta. Nós retiraríamos os nossos
soldados de lá e com alegria os traríamos para casa, se pudéssemos ter certeza
de que não há extremistas violentos no Afeganistão e no Paquistão, determinados
a matar o maior número possível de norte-americanos. A situação ainda não é
essa.
Por isso continuamos lá, numa coalizão de 46 países.
E, apesar dos custos envolvidos, a determinação dos EUA não enfraquecerá. De
fato, nenhum de nós pode tolerar esses extremistas. Eles já mataram em muitos
países. Já mataram gente de várias fés –mais do que de todas, eles mataram
muçulmanos. Aquelas ações são irreconciliáveis com os direitos humanos, com o
progresso das nações e com o Islam. O Santo Corão ensina que quem mata um
inocente, mata como se matasse toda a humanidade; e que quem salva um ser
humano, salva como se salvasse toda a humanidade. A resistente fé de mais de um
bilhão de seres humanos é muito maior que o ódio estreito de uns poucos. O
Islam não é parte do problema de combater o extremismo violento – é parte
importante da promoção da paz.
Sabemos também que só o poder militar não resolverá os
problemas no Afeganistão e no Paquistão. Por isso, planejamos investir 1,5
bilhões de dólares ao ano, nos próximos cinco anos, para ajudar os
paquistaneses a construir escolas e hospitais, estradas e empresas, e centenas
de milhões para ajudar os que perderam suas casas. Por isso estamos oferecendo
mais de 2 bilhões para ajudar os afegãos a desenvolver sua economia e oferecer
os serviços de que as pessoas necessitam.
Sobre a questão do Iraque. Ao contrário do
Afeganistão, o Iraque foi guerra que os EUA escolheram e provocou fortes
discussões em meu país e em todo o mundo. Embora eu acredite que os iraqueanos
estão hoje melhor, sem a tirania de Saddam Hussein, também acredito que os
eventos do Iraque ensinaram aos EUA a necessidade de usar a diplomacia e de
construir consenso internacional para resolver nossos problemas, sempre que
possível. De fato, lembro as palavras de Thomas Jefferson: “Espero que nossa
sabedoria aumente à medida que aumente nosso poder, e nos ensine que quanto
menos usarmos nosso poder, mais ele aumentará.”
Hoje, os EUA têm dupla responsabilidade: ajudar o
Iraque a forjar melhor futuro e entregar o Iraque aos iraqueanos. Deixei bem
claro para os iraqueanos que não buscamos novas bases e nada queremos de seu
território ou de seus recursos. A soberania do Iraque é do Iraque. Por isso
ordenei a retirada de nossas brigadas de combate em agosto próximo. Por isso
honraremos nosso acordo com o governo democraticamente eleito no Iraque, de
retirar nossos soldados das cidades iraqueanas em julho e removê-las, todas, até
2012. Ajudaremos os iraqueanos a treinar suas forças de segurança e a
desenvolver sua economia. Mas apoiaremos um Iraque seguro e único como
parceiros, não como dominadores.
Por fim, assim como os EUA jamais tolerarão a
violência dos extremistas, jamais alteraremos nossos princípios. O 11/9 foi
enorme trauma para nosso país. O medo e a ira que provocou foi compreensível,
mas em alguns casos levou-nos a agir ao contrário de nossos ideais. Tomamos
ações concretas para mudar de curso. Proibi inequivocamente o uso de tortura
pelos EUA, e ordenei que a prisão da baía de Guantânamo seja fechada até o
início do próximo ano.
Portanto, os EUA defender-se-ão, respeitando a
soberania das nações e sob o império da lei. E o faremos em parceria com
comunidades muçulmanas que também são ameaçadas. Quanto antes os extremistas
sejam isolados e não se sintam bem-vindos nas comunidades muçulmanas, mais
rapidamente todos teremos mais segurança.
A segunda melhor fonte de tensão que temos de discutir
é a situação entre israelenses, palestinos e o mundo árabe.
Todos conhecem os fortes laços que unem Israel e os
EUA. São laços inquebráveis. Baseiam-se em ligações culturais e históricas e no
reconhecimento da legitimidade da aspiração do povo judeu a ter uma pátria,
aspiração que se baseia na sua trágica história que não pode ser negada.
Em todo o mundo, o povo judeu foi perseguido, e o
antissemitismo na Europa culminou num Holocausto sem precedentes. Amanhã
visitarei Buchenwald, um dos campos da rede de campos nos quais os judeus foram
escravizados, torturados, executados a tiros e em câmaras de gás pelo Terceiro
Reich. Seis milhões de judeus foram mortos – mais do que toda a população de
judeus de Israel, hoje. Negar esses fatos é pensamento sem fundamento, é
ignorância e é manifestação de ódio. Ameaçar Israel de destruição – ou repetir
estereótipos vis sobre os judeus – é erro grave e só serve para evocar, na
mente dos israelenses suas memórias mais dolorosas, impedindo que haja a paz
que o povo daquela região merece.
Por outro lado, é inegável o sofrimento dos palestinos
– muçulmanos e cristãos –em busca de uma pátria. Há mais de 60 anos sofrem a
dor da deslocação. Muitos esperam em campos de refugiados na Cisjordânia, em
Gaza e em terras próximas, por uma vida de paz e segurança que jamais puderam
ter. Sofrem humilhações diárias – maiores e menores – resultado da ocupação. Aí
tampouco não cabem dúvidas: a situação do povo palestino é intolerável. Os EUA
não darão as costas às legítimas aspirações dos palestinos, por dignidade,
oportunidades e um Estado seu.
Ao longo de décadas, o impasse permaneceu: dois povos
com aspirações legítimas, cada um deles com sua história dolorosa que tornou
quase impossível qualquer acordo. É fácil denunciar; os palestinos denunciam os
refugiados criados pela fundação de Israel; e os israelenses denunciam a
constante hostilidade e os ataques ao longo de sua história, de fora e de
dentro de suas fronteiras. Mas se se vê o conflito ou pelos olhos de um, ou
pelos olhos de outro, não vemos a verdade: a única solução possível para
atender às aspirações dos dois lados é criarem-se dois Estados, nos quais
israelenses e palestinos possam viver em paz e em segurança.
Atende aos interesses de Israel e atende aos
interesses dos palestinos; atende aos interesses dos EUA e atende aos
interesses do mundo. Por isso me aplicarei pessoalmente para chegar a esse
resultado, com a paciência que a tarefa exige. Os deveres acordados pelas duas
partes no “Mapa do Caminho” são claros. Para que se faça a paz, é tempo de eles
– e todos nós – fazermos o que é de nossa responsabilidade.
Os palestinos devem abandonar a violência. Resistência
mediante violência e morte é errada e a nada leva. Durante séculos os negros
nos EUA sofreram o castigo do chicote como escravos e a humilhação da
segregação. E não venceram pela violência, nem foi a violência que lhes trouxe
a igualdade de direitos. Foi a insistência pacífica e determinada conforme os
ideais que são o centro da fundação dos EUA. O mesmo se pode dizer de outros
povos, da África do Sul ao Sul da Ásia; da Europa oriental à Indonésia. É uma
história e uma verdade simples: a violência e caminho sem saída. Não é sinal
nem de coragem nem de poder, disparar foguetes em quartos onde dormem crianças,
ou explodir idosas em ônibus. Assim, nenhuma autoridade moral pode impor-se;
assim, de fato, a autoridade moral rende-se.
É tempo de os palestinos focarem-se no que realmente
podem construir. A Autoridade Palestina deve desenvolver sua capacidade para
governar, com instituições que atendam às necessidades do povo. O Hamás tem
apoio de alguns palestinos, mas também tem responsabilidades. Para cumprir seu
papel e atender às aspirações dos palestinos, e para unir o povo palestino, o
Hamás tem de desistir da violência, reconhecer acordos passados e reconhecer o
direito de existência de Israel.
Ao mesmo tempo, os israelenses têm de reconhecer que,
assim como não se pode negar o direito à existência de Israel, tampouco se pode
negar o direito dos palestinos. Os EUA não aceitam a legitimidade da continuada
construção de colônias israelenses. Essas construções violam acordos existentes
e minam quaisquer esforços que se faça com vistas à paz. A construção de
colônias tem de parar.
Israel deve também cumprir sua obrigação de garantir
que os palestinos possam viver, trabalhar e desenvolver sua sociedade. Assim
como leva devastação às famílias palestinas, a continuada crise humanitária em
Gaza não contribui para a segurança de Israel; nem a continuada falta de
oportunidades na Cisjordânia. Permitir melhores condições de vida diária para o
povo palestino tem de ser parte da via da paz. E Israel deve tomar medidas
concretas para tornar possíveis aquelas condições.
Por fim, os Estados árabes devem reconhecer que a
Iniciativa da Paz Árabe foi importante primeiro passo, mas não põe fim a todas
as responsabilidades. O conflito árabes-Israel não deve continuar a ser usado
para distrair a atenção dos povos de nações árabes, de outros problemas. Em vez
disso, deve ser causa de ações para ajudar o povo palestino a desenvolver
instituições que sustentem um Estado palestino; para reconhecer a legitimidade
de Israel; e para escolher o progresso, em vez do foco de autoderrota, do
passado.
Os EUA alinharemos nossas políticas ao lado dos que
busquem a paz. Diremos em público o que dizemos privadamente aos israelenses,
aos palestinos e aos árabes. Não podemos impor a paz. Privadamente, muitos
muçulmanos reconhecem que Israel não sairá de lá. Assim também, muitos
israelenses reconhecem que é preciso criar um Estado palestino. É tempo de os
EUA agirem na direção do que todos sabem que é verdade.
Muitas lágrimas já correram. Muito sangue já foi
derramado.. Todos temos a responsabilidade de agir para que chegue o dia em que
mães israelenses e palestinas possam ver seus filhos crescer sem medo; quando a
Terra Santa das três maiores religiões seja o lugar de paz que Deus quer que
sejam; quando Jerusalém seja lar seguro e permanente para judeus, para cristãos
e para muçulmanos, e lugar onde todas as crianças de Abraão vivam juntas e em
paz, como na história de Isra, quando Moisés, Jesus e Maomé (que a paz esteja
com eles) reuniram-se em oração.
A terceira fonte de tensão é o interesse que todos
temos quanto aos direitos e responsabilidade das nações, quanto às armas
nucleares.
Essa questão tem sido uma fonte de tensão entre os EUA
e a República Islâmica do Iran. Por muitos anos, o Iran definiu-se em parte
pela oposição ao meu país e há, sim, uma história tormentosa entre nós. No meio
da Guerra Fria, os EUA desempenharam um papel na derrubada de um governo
iraniano democraticamente eleito. Desde a revolução islâmica, o Iran desempenha
um papel em atos de tomada de reféns e ataques violentos contra soldados e
civis norte-americanos. Essa história é bem conhecida. Mais do que nos deixar
prender no passado, tenho repetido claramente aos líderes e ao povo iranianos
que meu país está preparado para avançar. A questão, hoje, não tem a ver com o
que o Iran seja contra, mas tem a ver, sim, com o futuro que o Iran queira
construir.
Será difícil superar décadas de desconfiança, mas
agiremos com coragem, retidão e determinação. Haverá questões a discutir entre
os dois países e estamos dispostos a avançar sem precondições, a partir de
mútuo respeito. Mas é claro que, em tudo quanto tenha a ver com armas
nucleares, alcançamos um ponto sem volta. Não se trata apenas de defender
interesses dos EUA. Trata-se de evitar uma corrida nuclear armamentista no
Oriente Médio, que poria essa região do mundo em rota de imenso perigo.
Entendo os que protestam, porque alguns países têm
armas nucleares e outros não têm. Nenhuma nação pode escolher e decidir quais
nações tenham armas nucleares. Por isso, reafirmei fortemente o compromisso dos
EUA com buscar um mundo em que nenhuma nação tenha armas nucleares. E todas as
nações – inclusive o Iran – devem ter direito de desenvolver capacidades
nucleares para finalidades pacíficas, desde que assumam os direitos e os
deveres garantidos pelo Tratado de Não-proliferação de Armas Nucleares. Esse
compromisso é o núcleo do Tratado e deve ser obrigatório pra todos que firmem o
Tratado. Tenho esperanças que todos os países na Região partilhem esse
objetivo.
A quarta questão da qual tratarei é a democracia.
Sei que tem havido controvérsia sobre a promoção da
democracia nos anos recentes e muito dessa controvérsia está ligada à guerra no
Iraque. Permitam-me ser claro: nenhum sistema ou governo pode ou deve ser
imposto por uma nação a outra.
Isso, contudo, não enfraquece o meu compromisso com
governos que reflitam o desejo popular. Cada nação dá vida a esse princípio à
sua maneira, enraizado nas tradições de seu povo. Os EUA não têm a pretensão de
saber o que é melhor para todos, tanto quanto não têm a pretensão de alterar o
resultado de eleições pacíficas. Mas eu creio profunda e inabalavelmente que
todos os povos anseiam por algumas coisas: a capacidade de se manifestar e de
ter voz sobre como cada um é governado; confiança na lei e na justa
administração da justiça; governo transparente que não roube o povo; liberdade
para viver como se escolha viver. Não são só ideias norte-americanos: esses são
direitos humanos, e, por isso, os EUA os apoiarão sempre, em todos os lugares.
Não há caminho simples para cumprir essa promessa. Mas
há, de claro, o seguinte: governos que protejam esses direitos acabam sempre
por ser mais estáveis, mais bem-sucedidos e a oferecer melhor segurança.
Suprimir ideias jamais conseguiu fazê-las desaparecer. Os EUA respeitam o
direito de todas as vozes pacíficas e respeitadoras da lei que se façam ouvir
em todo o mundo, ainda que discordem delas. E acolheremos todos os governos
eleitos e pacíficos – sempre que governem com respeito a todo o povo.
Esse último ponto é importante porque há os que
defendem a democracia só enquanto estejam longe do poder; uma vez chegados ao
poder, tornam-se cruéis opressores dos direitos de outros. Não importa onde
seja, o governo do povo e pelo povo é padrão simples para todos os que cheguem
ao poder: é indispensável manter o poder pelo consenso, não pela coerção; é
indispensável respeitar os direitos das minorias, e participar, com espírito de
tolerância e respeito aos acordos; é indispensável pôr o interesse do povo e os
resultados legítimos do processo político acima do partido de cada um. Sem
esses ingredientes, só eleições não bastam para produzir verdadeira democracia.
A quinta questão de que devo falar também é a
liberdade de religião.
O Islam tem honrada tradição de tolerância. Vemos na
história da Andaluzia e de Córdoba, durante a Inquisição. Vi em primeira mão,
criança na Indonésia, onde cristãos devotos gozam de liberdade de culta em país
predominantemente muçulmano. Precisamos desse espírito, hoje. Todos, em todos
os países, devem ser livres para escolher e viver a própria fé, por persuasão
de mente, coração e alma. Essa tolerância é essencial para que as religiões
floresçam, tanto quanto é ameaçada por muitos e diferentes modos.
Entre os muçulmanos, há uma perturbadora tendência a
avaliar a própria fé pela rejeição de outras fés. A riqueza da diversidade
religiosa deve ser defendida – seja para os maronitas no Líbano ou os coptas no
Egito. Devem-se costurar as fraturas também entre os muçulmanos; as divisões
entre sunitas e a Xia já levaram a muito trágica violência, sobretudo no
Iraque.
A liberdade de religião é central para que os povos
consigam viver juntos, Devemos sempre examinar os modos mediante os quais
protegemos a liberdade de religião. Nos EUA, por exemplo, regras sobre doações
para finalidades religiosas tornaram difícil, para muitos muçulmanos, cumprir
algumas de suas obrigações. Por isso comprometi-me a trabalhar ao lado dos
muçulmanos norte-americanos, para que possam cumprir o dever de pagar o zakat.
Assim também, é importante que os países ocidentais
evitem impedimentos para que os cidadãos muçulmanos pratiquem a religião como
decidam praticá-la – por exemplo, tentando determinar o tipo de roupa a ser
usado pelas mulheres muçulmanas. Impossível não ver que há hostilidade
disfarçada contra algumas religiões, por trás dessa máscara de liberalismo.
A religião deve, sempre, nos unir, todos. Por isso,
estamos preparando projetos públicos para aproximar cristãos, muçulmanos e
judeus. Por isso acolhemos com alegria os esforços do rei Abdullah da Arábia
Saudita, de seu diálogo entre várias religiões e a liderança da Turquia na
Aliança das Civilizações. Em todo o mundo, temos de converter os diálogos em
ações de aproximação entre as várias religiões, para, assim construir pontes
que levem os povos à ação conjunta – seja para combater a malária na África,
seja nos momentos de catástrofes naturais.
A sexta questão sobre a qual quero falar são os
direitos das mulheres.
Sei que há muito debate sobre essa questão. Rejeito o
ponto de vista de alguns no ocidente, de que a mulher que escolha cobrir os
cabelos seria de algum modo menos igual às demais mulheres, mas também creio
que se se nega educação às mulheres se lhes sonega direitos de igualdade. Não
por acaso, os países em que as mulheres têm acesso a plena educação têm mais
probabilidades de alcançar a prosperidade.
Quero aqui ser bem claro: a igualdade para as mulheres
não é questão e objeto de discussão, nem é problema, só para o Islam. Na
Turquia, no Paquistão, em Bangladesh e na Indonésia, vimos países com maioria
de muçulmanos elegerem mulheres para postos de liderança. Ao mesmo tempo,
prossegue a luta por direitos iguais para as mulheres em muitos campos da vida
nos EUA e em vários outros países do mundo.
Nossas filhas podem contribuiu tanto, para a
sociedade, quanto nossos filhos, e nossa prosperidade comum só aumentará de
houver condições para que todos – homens e mulheres – alcancem seu pleno
potencial. Não acho que as mulheres devem fazer as mesmas escolhas que os
homens para serem iguais, e respeito as mulheres que escolham viver suas vidas
nos papeis tradicionais femininos. Mas tem de ser escolha das mulheres. Por
isso, os EUA trabalharão como parceiros de qualquer país de maioria muçulmana
para apoiar a expansão da alfabetização para meninas, para estimular que as
jovens trabalhem mediante microfinanciamentos que ajudem as pessoas a realizar
seus sonhos.
Por fim, quero discutir desenvolvimento econômico e
oportunidade.
Sei que, para muitos, a face da globalização é
contraditória. A internet e a televisão podem trazer conhecimento e informação,
mas também sexualidade ofensiva e violência a mais absurda. O comércio pode
trazer riqueza e oportunidades, mas também enormes rupturas e mudanças nas
comunidades. Em todas as nação, também na minha, essa mudança pode provocar
medo. Medo de que, por causa da modernidade, percamos o controle sobre nossas
escolhas econômicas, nossas políticas e, mais importante, sobre nossa
identidade – tudo o que mais prezamos nas nossas comunidades, nossas famílias,
nossas tradições e nossa fé.
Mas também sei que não se pode negar o progresso
humano. Não tem de haver contradição entre desenvolvimento e tradição. Países
como o Japão e a Coreia do Sul viram suas economias crescerem, sem deixar de
manter culturas distintas. O mesmo vale para o espantoso progresso de países de
maioria muçulmana, de Kuala Lumpur a Dubai. Em tempos antigos e nos nossos
tempos, sempre houve e há comunidades muçulmanas da linha de frente da inovação
e da educação.
É importante, porque nenhuma estratégia de
desenvolvimento pode ser baseada apenas no que vem da terra, nem será
sustentável se os mais jovens não encontrarem empregos. Muitos Estados do Golfo
gozaram de grande prosperidade por causa do petróleo, e alguns estão começando
a focar-se em desenvolvimento mais amplo . Mas todos temos de reconhecer que
educação e inovação serão a moeda de troca do século 21, e ainda há muitas
comunidades muçulmanas nas quais o subdesenvolvimento ainda predomina nessas
áreas. Estou reforçando esses investimentos nos EUA. E, se os EUA, no passado,
visaram prioritariamente o petróleo e o gás nessa parte do mundo, agora
buscamos engajamento mais amplo.
Na educação, expandiremos programas de intercâmbio,
aumentaremos as bolsas de estudo, semelhantes às que levaram meu pai aos EUA,
ao mesmo tempo em que estimularemos que mais norte-americanos estudem em
comunidades muçulmanas. Haverá bolsas para estudantes muçulmanos promissores,
para que prossigam seus estudos nos EUA; investiremos em formação à distância
para professores e crianças em todo o mundo; e criaremos uma nova rede online,
de modo que um adolescente no Kansas possa comunicar-se instantaneamente com um
adolescente no Cairo.
Para o desenvolvimento econômico, criaremos um novo
corpo, no mundo dos negócios, para os que queiram encontrar parceiros nos
países de maioria muçulmana. Participarei de um encontro de cúpula sobre
empreendedorismo, esse ano, para encontrarmos meios para aprofundar laços entre
líderes empreendedores, fundações e empreendedores do campo social nos EUA e em
comunidades muçulmanas em todo o mundo.
No campo da ciência e da tecnologia, lançaremos um
novo fundo para apoiar o desenvolvimento tecnológico em países de maioria
muçulmana, e para levar idéias ao mercado, porque assim se criam empregos.
Abriremos novos centros de produção científica de excelência na África, no
Oriente Médio e no sudeste da Ásia e indicaremos novos enviados especialistas
em ciências para que colaborem em programas para desenvolver fontes
alternativas de energia, criar empregos ‘verdes’, digitalizar dados e
informações, reciclar resíduos e aumentar colheitas. E hoje estou anunciando um
novo esforço global com a Organisation of the Islamic Conference para erradicar
a pólio. Também estamos expandindo as parcerias com comunidades islâmicas para
promover a atenção médica à saúde maternal e neonatal.
Todas essas iniciativas devem ser implementadas em
parcerias. Os norte-americanos estão preparados para reunir-se aos demais
cidadãos e demais governos; às organizações comunitárias, aos líderes
religiosos, aos homens de negócio nas comunidades muçulmanas em todo o mundo,
para ajudar nosso povo a alcançar uma vida melhor.
Nenhuma das questões que descrevi são fáceis de resolver.
Mas é nossa responsabilidade nos reunirmos em nome do mundo que buscamos – um
mundo no qual os extremistas não ameacem nosso povo; que os soldados
norte-americanos estejam de volta à casa; um mundo no qual israelenses e
palestinos, cada um vivam seguros em seu próprio Estado, e a energia nuclear
seja usada para finalidades pacíficas; um mundo no qual os governos sirvam aos
cidadãos e os direitos de todos os filhos de Deus sejam respeitados. Esses são
interesses mútuos. Esse é o mundo que buscamos. Mas só o poderemos alcançar
juntos.
Sei que há muitos – muçulmanos e não-muçulmanos – que
questionam se poderemos forjar esse novo começo. Uns anseiam por fazer subir as
chamas da divisão e pôr-se como obstáculo no caminho do progresso. Outros
sugerem que o esforço não vale a pena – que estamos condenados à dissensão, e
as civilizações fatalmente entrarão em choque. Muitos mais são simplesmente
céticos, não crêem que possa ocorrer qualquer mudança real. Há tanto medo,
tanta desconfiança. Mas se escolhermos nos deixar prender no passado, jamais
andaremos adiante. Quero dizer, sobretudo aos mais jovens de todas as fés, em
todos os países – vocês, mais do que quaisquer outros, podem refazer esse
mundo.
Todos partilhamos esse mundo, apenas por pequena fatia
de tempo. A questão é se consumiremos esse tempo dedicados ao que nos mantém
separados, ou se nos comprometeremos num esforço – um esforço sustentando –
para encontrar base comum a todos, para nos focar no futuro que buscamos para
nossos filhos, respeitando a dignidade de todos os seres humanos.
É mais fácil começar guerras do que pôr-lhes ponto
final. Mais fácil culpar os outros, do que olhar para dentro; ver o que é
diferente, em alguém, do que ver o que temos em comum. Mas temos de escolher o
caminho certo, não apenas o caminho mais fácil. Há regra que rege, no coração
de todas as religiões – que façamos aos outros, como queremos que nos façam a
nós. Essa verdade transcende nações e povos – uma crença que não é nova; que
não é nem branca nem negra nem mulata; que não é cristã, muçulmana ou judia.
Uma crença que pulsava no berço da civilização, e que ainda pulsa no coração de
bilhões. É uma fé em outro povo, e é o que me trouxe hoje aqui.
Temos o poder para fazer o mundo que buscamos, mas só
se tivermos coragem para produzir um novo começo, sem perder de vista o que
está escrito.
O Santo Corão nos diz: “O humanidade! Homem e mulher
te criamos; e em nações e tribos, para que se conheçam uns os outros.”
O Talmud nos diz: “Toda a Torá promove a paz.”
A Bíblia Sagrada nos diz: “Abençoados os que fazem a
paz, pois serão chamados filhos de Deus.”
Os povos do mundo podem viver juntos em paz. Essa é a
visão de Deus. Agora, esse tem de ser nosso trabalho aqui na Terra. Obrigado.
Que a paz de Deus esteja com vocês.
Era também sinto a utopia de IMAGINE...
LOLA
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