LOLITA
Um dia deram-me este livro, precisamente em Francês! Iniciei a leitura e pareceu-me um relato ousado da relação amorosa entre o professor de música e lolita, uma miúda de doze anos!
Um pouco mais tarde num texto de Nuno Crato (ainda não ministro) li uma referência ao autor numa faceta de não escritor mas sim de amante da investigação, mais especificamente, do estudo de borboletas!
As borboletas de Nabokov
Nuno
Crato (www.expresso.pt)
0:00 Quarta
feira, 16 de Fevereiro de 2011
Nos
anos 1940, um homem pouco conhecido pelos seus estudos de história natural
analisou com cuidado um tipo de borboletas conhecidas como "Polyommatus
blues". Trata-se de um grupo de espécies que se encontram por toda a
América do Norte e que se pensava estarem estreitamente relacionadas. No
entanto, esse homem descobriu estarem ligadas apenas através de ascendentes
comuns de há vários milhões de anos. Classificando as borboletas pelos seus
órgãos genitais, o que implicou uma recolha de muitos espécimenes e uma
paciência infinita, o investigador concluiu que seria provável que tivessem
vindo de Ásia, onde se encontravam os progenitores longínquos, passando através
do Estreito de Bering em cinco vagas sucessivas. Só assim conseguia explicar a
diversidade encontrada.
Na
altura, não se conhecia a estrutura do DNA e os raciocínios baseavam-se na
morfologia das espécies. Na semana passada, contudo, um grupo de investigadores
de Harvard, de Barcelona e de várias universidades norte-americanas publicou
nos "Proceedings of the Royal Society" de Londres um artigo que
relata um estudo do DNA dessas borboletas e conclui a favor dessa teoria migratória
(doi:10.1098/rspb.2010.221). Como verificaram os autores do artigo, muitas
espécies que existem no Novo Mundo estão geneticamente mais relacionadas com as
que se encontram na Ásia do que entre si, de tal forma que se conseguem detectar
cinco grupos nas Américas, relacionados com outros tantos grupos asiáticos, o
que sustenta a hipótese das cinco migrações. As divergências genéticas reforçam
também a hipótese de as migrações se terem realizado há 10 milhões de anos,
altura em que havia uma ponte terrestre entre a Ásia e a América do Norte no
que é hoje o Estreito de Bering.
Tudo
isto são grandes notícias para os entomólogos, mas são também notícias
interessantes para os amantes da boa literatura. É que o investigador em causa
recolheu as borboletas que lhe permitiram fazer todo o estudo enquanto passeava
pelo oeste norte-americano escrevendo os seus romances. O homem chamava-se
Vladimir Nabokov. É o autor de "Lolita" e de outras grandes obras da
literatura do século XX.
Nabokov
nasceu em São Petersburgo em 1899 e abandonou a sua terra natal em 1919.
Estudou línguas eslavas e românicas em Cambridge, no Reino Unido, e juntou-se
depois à família em Berlim. Com a subida dos nazis ao poder refugiou-se em
França e depois nos Estados Unidos, onde chegou em 1940. Trabalhou no Museu
Americano de História Natural, em Nova Iorque. Deslocou-se depois para
Massachusetts, ensinou em Wellesley e em Cornell e trabalhou no Museu de
Zoologia Comparada de Harvard. Falava e escrevia fluentemente em russo e em
inglês e, o que é extremamente raro, tanto produziu boa literatura num idioma
como no outro.
Em
1953, enquanto passeava pela costa oeste coleccionando borboletas, escreveu
"Lolita", o romance que lhe deu fama internacional e que lhe permitiu
passar a viver apenas da escrita. Deslocou-se para a Suíça, onde veio a falecer
em 1977.
No
seu tempo, Nabokov era considerado um simples coleccionador de borboletas, um
homem com persistência e capacidade de observação, mas sem capacidade para
fazer avançar a ciência. No ano passado, contudo, veio-se a descobrir que o que
ele tinha descrito como uma nova espécie ("Karner Blues") e que na
altura tinha sido considerado um erro de classificação era de facto uma espécie
distinta. Agora, a análise genética vem corroborar a sua especulação sobre as
migrações de borboletas. Seria um feito para um cientista profissional. É um
feito espectacular para um cientista amador.
Texto
publicado na edição do Expresso de 12 de fevereiro de 2011
Vladimir
Nabokov, o genial escritor de que aqui falámos na semana passada, escreveu um
poema em que descrevia o seu trabalho de entomólogo, mais precisamente, de
estudioso de borboletas. Orgulhava-se de se ter tornado "padrinho de um
insecto, depois de o ter descoberto e descrito pela primeira vez", e
concluía: "não quero outra fama".(...)
Texto
publicado na edição do Expresso de 19 de fevereiro de 2011
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