quarta-feira, 12 de março de 2014

Descartes: dualismo antropologico

Ilustração do dualismo de René Descartes: as sensações são transmitidas pelos órgãos dos sentidos à glândula pineal no cérebro e depois ao espírito imaterial.


Descartes: dualismo antropologico




Eu descrevera, depois disso, a alma racional, e mostrara que ela não pode ser de modo algum tirada do poder da matéria, como as outras coisas de que falara, mas que deve expressamente ter sido]; e como não basta que esteja  alojada no corpo humano, assim como um piloto em seu navio, exceto talvez para mover seus membros, mas que é preciso que esteja junta e unida estreitamente com ele para ter, além disso, sentimentos e apetites semelhantes aos nossos, e assim compor um verdadeiro homem. De resto, eu me alonguei um pouco aqui sobre o tema da alma, porque é dos mais importantes; pois, após o erro dos que negam Deus, que penso haver refutado suficientemente mais acima, não há outro que afaste mais os espíritos fracos do caminho reto da virtude do que imaginar que a alma dos animais seja da mesma natureza que a nossa, e que, por conseguinte, nada temos a temer, nem a esperar, depois dessa vida, não mais do que as moscas e as formigas; ao passo que, sabendo-se o quanto diferem, compreende-se muito mais as razões que provam que a nossa é de uma natureza inteiramente independente do corpo e, por conseguinte, que não está de modo algum sujeita a morrer com ele; depois, como não se vêem outras causas que a destruam, somos naturalmente levados a julgar por isso que ela é imortal.

Descartes, Discurso do Método

O fundador do Dualismo teria sido Descartes, que formalizou a versão mais conhecida do dualismo em 1641, ao reconhecer a existência de duas espécies diferentes de substâncias: a corpórea e a espiritual
Descartes foi o primeiro a assimilar claramente o espírito (substância imaterial) à consciência e distingui-lo do cérebro, que seria o suporte da inteligência. Chamou a mente de res cogitans ("coisa pensante") e o corpo de res extensa ("coisa extensa", isto é, que ocupa lugar no espaço). A ligação entre a mente e corpo, segundo ele, seria feita através do tálamo, uma pequenina parte do cérebro. Foi Descartes, portanto, quem primeiro formulou o problema do corpo-espírito do modo como se apresenta modernamente. Assim, em termos metafísicos, a realidade se constitui de duas substâncias - material e espiritual - sendo a substância material, a realidade sensível; e o espírito, o não físico, não material, constituindo a realidade mental ou espiritual.


Terà sido este o ERRO DE DESCARTES?







Na obra " O erro de Descartes", o neurocirurgião português Antonio Damasio apresenta uma nova interpretação acerca do cogito, ergo sum cartesiano. De uma plenitude da razão salta-se para uma ética das emoções.


Quem deu o diagnóstico, há pouco mais de uma década, foi o neurologista António R. Damásio: o filósofo francês René Descartes errou. 
O “Penso, logo existo”, que até então era pedra fundamental para o pensamento racional, de repente, tornou-se erro. Mais do que uma simples provocação, o debate é relevante e nos remete à seguinte questão: Por que pensamos o que pensamos? Continuamos sem o saber, mérito da singularidade humana – a possibilidade de questionar-se. O pensar, a razão, expressão de nossa condição prescinde de outra face: o sentimento e a emoção.
As pessoas tomam decisões e nem sempre são pautadas somente pela racionalidade ou pela razão. O que pensar de um indivíduo capaz de atentar contra a vida de outro e dizer “foi por amor”? É possível que muitos digam “Ele (ou ela) não pensou no que estava fazendo”. Seria a razão a responsável pela tomada de decisão e o fator determinante para as consequências esperadas ou rejeitadas.
Uma justificativa para grandes crimes, sem a necessidade de individualizar um ou outro, é a defesa alegar que o réu não estava no domínio de sua razão, o que teria prejudicado sua tomada de decisão e o levado a cometer este ou aquele crime.
Nossa vida comum e cidadã é frequentemente afetada por esse discurso, já que se desvinculam a emoção e o sentimento da razão. São promovidos determinados comportamentos em detrimento de outros, assim como se justificam atos pela presença ou falta da razão.
São notícias, comentários, por vezes uma justificativa para um comportamento que consideramos inadequado e lá se vai mais uma culpa para as emoções e mais um ponto para a razão. Expressão da chamada postura cartesiana – alcança o homem e o reduz.
Retrato do caso de Phineas Gage.

E foi da história de Phineas P. Gage que Damásio partiu, ainda que não fizesse parte de um grande projeto, para a tentativa de um vislumbre de resposta ao que é o humano. E, graças aos seus vinte e alguns anos de pesquisas, podemos dizer: “Penso, sinto, logo existo.”

Por uma teoria que explique o erro

Phineas Gage, 25 anos em 1848, era capataz de uma empreiteira de estradas de ferro na Nova Inglaterra e sua principal tarefa era coordenar as explosões das pedras que abririam caminho para o assentamento dos trilhos através da cidade de Vermont. Em uma das explosões, ocorre uma falha, e Gage tem seu rosto e crânio atravessados por uma longa barra de ferro de 4 metros de comprimento por 3 centímetros de espessura. Continua consciente e é socorrido por seus colegas. Uma vez atendido, apesar dos poucos recursos possíveis, ele sobrevive. Mas seu destino seria cruel: o homem que era o mais competente em seu grupo perde seu poder de decisão e passa por alterações de comportamento sucessivas, até a decrepitude total de sua vida pessoal e social. O estudo deste caso permitiu o reconhecimento de que o poder de decisão 
de um homem está relacionado ao cérebro, assim como as dimensões sociais e pessoais da vida humana. Gage não conseguia manter-se em algum emprego, passou a comportar-se de forma antissocial e, por fim, perdeu sua capacidade de planear o futuro. Uma lesão no lobo pré-frontal  impedia-o de associar as emoções às suas decisões.



Por Elizabeth Luft, In Revista Filosofia (adaptado)







Lola


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