Yanis Varoufakis. #varoufucker, o Deus
grego
Varoufakis emigrou de Atenas para os Estados Unidos por causa da crise, que
lhe rebentou com o ordenado e os seus projectos na universidade de Atenas. A
família recebeu ameaças de morte por causa dos seus discursos contra os
banqueiros gregos. Regressa a Atenas só agora, convidado por Tsipras para ser
candidato pelo Syriza.Varoufakis já sabe há muito tempo que, comparado com o
que espera o Syriza na Europa, a Odisseia
O ministro das Finanças
grego é sexy, porra.” O espanto da deputada socialista Isabel Moreira publicado
no Facebook foi parar ao circunspecto “Financial Times”, com o “porra”
suavemente traduzido por “damn”. Afinal, Isabel Moreira tinha verbalizado
aquilo que, mais do que a proposta grega de renegociação da dívida, estava a
arrebatar a Europa – o desmesurado sex-appeal de Yanis Varoufakis, o homem das
Finanças do novo governo grego. O “Financial Times” não podia falhar a notícia
porque, antes e depois da crise financeira de 2008, da iminência da queda do
euro, do resgate dos bancos, da troika instalada na Grécia, na Irlanda e em
Portugal, da recessão, nunca um corpo governativo da zona euro tinha provocado
tal excitação colectiva. A mudança política na Grécia é drástica a todos os
níveis – que seja um símbolo sexual a confrontar a Europa com uma mudança
radical de políticas torna os dias que correm ainda mais espectaculares. No
twitter, foi criada a hashtag “#varoufucker” – se os detractores do grego se
deleitam com a possibilidade de comparação negativa com a expressão
“motherfucker”, os outros invocam na hashtag um entusiasmo global. E, sim, dava
a ideia de que a directora do FMI, Christine Lagarde, depois da reunião com
Varoufakis, parecia deleitada. É ver as fotos.
A escritora espanhola
Elvira Lindo, numa crónica no “El Pais”, comparou Varoufakis a uma estátua
grega e suspirou que só de ver a chegada do ministro a Downing Street para o
encontro com George Osborne, “a semana já tinha valido a pena”. Sim, Elvira
Lindo deleita-se nos “crânios privilegiados dos gregos”, no caso “no sentido
estético”. “É certo que o físico dos gregos tem qualquer coisa de alarmante.
Cada cabeça é uma escultura e a de Varoufakis, que não podia ser menos, parece
que foi esculpida há séculos e se, quando está sério, apresenta um tom marmóreo
que intimida, ao sorrir faz-nos gostar da proximidade, cosmopolitismo e
mundanidade.”
Yanis Varoufakis não é
um político e nem sequer é um militante clássico do Syriza. Foi conselheiro
económico de Georges Papandreou, o primeiro--ministro socialista que chamou a
troika a Atenas, distanciando-se do PASOK em 2006. Em Junho de 2013, escreve um
texto no “New York Times” em conjunto com o economista James K. Galbraith, em
que declara o seu apoio ao Syriza: “Só o Syriza pode salvar a Grécia” era o
título. Justificação: “Neste momento o Syriza é a melhor esperança da Europa.
Os gregos não querem abandonar o euro nem assistir à desintegração da zona
euro, que poderia rebentar com a União Europeia. Mas eles também sabem que a
política da Europa face à crise, envolvendo austeridade cada vez mais violenta
e maiores empréstimos, falhou miseravelmente. Se estas políticas não mudam, o
colapso total da economia grega é iminente. Os requisitos básicos para uma
reforma podem ser encontrados nos tratados existentes.”
Varoufakis é um
moderadíssimo irritado com a maneira como a Europa está a lidar com a crise. Um
comunista radical nunca teria aconselhado o PASOK e o próprio diário inglês
conservador “The Telegraph” anuncia: “O ministro grego das Finanças não é
nenhum extremista.” E acrescenta: “Não é o socialista ferrabrás de que se
poderia estar à espera.”
Quando foi convidado por
Alexis Tsipras para as listas de deputados do Syriza, Varoufakis anunciou no
seu blogue que iria aceitar – todos os que o liam estavam familiarizados “com
os seus esforços para encontrar uma proposta modesta para resolver a crise do
euro” – formulada em livro. “Estas propostas não terão qualquer hipótese,
percebi agora, até, e a menos que, sejam negociadas no Eurogrupo, no Ecofin e
no Conselho Europeu.” “É por isto que quando Alexis Tsipras me convidou para me
candidatar ao parlamento de Atenas, com o objectivo de desempenhar um papel nas
negociações gregas com Berlim, Frankfurt e Bruxelas, não podia deixar de
aceitar.”
Na véspera de se
candidatar a deputado, o “maior medo” de Varoufakis era “transformar-se num
político”: “Como antídoto para esse vírus decidi escrever a minha carta de
demissão e trazê-la sempre no bolso, pronta para ser entregue se sentir sinais
de que estou a falhar o compromisso de falar a verdade.”
A Odisseia, em comparação, é um passeio no parque
A quantidade de material
já escrito sobre o sexy “Syriza man” – os próprios jornais alemães estão cheios
de lancinantes apoios, não à causa grega, mas ao corpo e ao estilo de
Varoufakis – não tem colocado a questão que o próprio ministro das Finanças já
colocou a si próprio há bastante tempo. A vitória do Syriza pode ser destruída
pelo próprio Syriza. “Que efeito pode ter uma vitória no próprio Syriza? Pode
um partido radical de esquerda manter a sua coesão perante os banqueiros
centrais e os seus homólogos neoliberais conservadores na Alemanha, na Holanda,
na Finlândia, em França ou Espanha?” Varoufakis admite o risco de as
circunstâncias favorecerem uma curta vida a qualquer governo de esquerda. “O
Syriza pode ter a oportunidade de transformar a Grécia e mudar o curso da
história europeia, mas isto é uma tarefa que faz parecer a viagem da Odisseia
um passeio no parque. Não será fácil exercer o poder e manter-se fiel a uma
agenda radical, enquanto se mantém a coesão interna. Ainda se está para ver
como é que os líderes do Syriza vão atingir este milagre. Eu penso que é
possível, não fazendo promessas tolas antes das eleições e apresentando uma
agenda verdadeiramente radical, com o objectivo de transformar a Europa,
propondo aos cidadãos da Alemanha, da Espanha, da Holanda, uma agenda europeia
que restaure o sonho europeu da partilha da prosperidade.” Como se vê,
Varoufakis antecipa a possibilidade de que qualquer cedência grega possa fazer
os mais radicais militantes do Syriza revoltarem-se enquanto o governo luta
contra Hércules. Sim, há imensa literatura grega para ser utilizada neste
contexto mas a ideia de que a “Odisseia” de Homero, comparado com o que se está
a passar na Europa, é um passeio no parque, é suficientemente clara.
Yanis Varoufakis vai
fazer em Março 54 anos. Nasceu em Atenas, mas tem nacionalidade australiana,
onde viveu vários anos. No fundo, enquanto nacional da Commonwealth, o homem
que se apresentou de casaco de cabedal e camisa azul eléctrica em Downing
Street, para o encontro com Osborne, o chanceler do Tesouro, era também um
súbdito de Sua Majestade. Os jornais têm enchido páginas de comentários sobre a
roupa de Varoufakis, criticada por um estilo “boxer”, elogiada pelo
casual-chique que contrasta com a farda maldita e feiosa do fato oficial de
governante, ou até posta em questão por outra coisa: como é que um homem que se
apresenta na Europa como ministro de “um país falido” pode – ou deve – gastar
tanto dinheiro num cachecol Burberry? A foto de Varoufakis no fim do encontro
com a directora do FMI, Christine Lagarde, incendiou mais uma vez jornais e
redes sociais. Na melhor das hipóteses para o estatuto de
pobrezinho-mas-honrado, o cachecol seria uma imitação. Varoufakis não
esclareceu.
Varoufakis explica que cachecol da
Burberry foi um presente da mulher
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Varoufakis ontem à chegada à reunião do
EurogrupoFotografia © EPA/JULIEN WARNAND
O ministro das Finanças grego, conhecido pelo seu
visual descontraído, fez sensação esta quarta-feira ao aparecer na reunião do
Eurogrupo com um cachecol da marca de luxo Burberry.
Hoje um dos seguidores
de Yanis Varoufakis no Twitter resolveu perguntar ao ministro grego sobre a
origem do cachecol. E a surpresa chegou quando o governante respondeu à
curiosidade geral: "Já que perguntou, é um presente de há 12 anos da minha
mulher. Satisfeito?"
In DN Globo, por A. M.12 fevereiro 2015
Danae salva Yanis depois do choque da partida de Xenia
Quando Varoufakis se
divorciou da primeira mulher, a sua filha Xenia era muito pequenina. A mãe quis
levá-la para Sydney e o economista lidou pessimamente com a situação. Hoje,
compreende-a, admitindo que na altura não levou a coisa a bem. Em 2011, num
post no seu blogue com o título “De uma calamidade pessoal à esperança
restaurada”, Yanis Varoufakis conta a história da separação da filha, um choque
de que só se curou depois de conhecer a artista plástica Danae Stratou, de 50
anos, com quem hoje vive.
“Pessoalmente, a minha
vida sofreu uma reviravolta má, ainda antes da crise financeira global. Nesse
Agosto de 2005, a minha filha muito pequena, Xenia, foi levada para a
Austrália. Por razões que hoje reconheço como legítimas, a mãe de Xenia decidiu
levá-la para Sydney e passar a viver lá permanentemente. A perda de Xenia
deixou-me num estado de choque (desde então ela vive em Sydney, o que garante a
minha ligação com Sydney para toda a vida).”
Varoufakis reconhece que
“teve sorte” porque poucos meses depois foi “salvo” por Danae Stratou, a mulher
com quem partilha hoje “a vida, o trabalho e uma miríade de projectos”. Os anos
foram passando. “Xenia cresce como uma pessoa autónoma e as peças da minha vida
que foram tão violentamente separadas em 2005 estão a recompor-se.”
A crise apanha Yanis
Varoufakis na Universidade de Atenas e tem um forte impacto na sua vida
pessoal. “Tudo o que eu tinha criado na Universidade de Atenas colapsou, tanto
os programas de licenciatura como de pós-graduação”, escreveu no seu blogue. O
seu rendimento baixou consideravelmente, “o que é de enorme importância tendo
em conta as minhas obrigações para com a Xenia, que vive num país cuja moeda
estava em constante valorização ao mesmo tempo que o meu salário ia descendo”.
Mas para a decisão de abandonar Atenas, contribuíram também “as ameaças de
mortes a membros da família” por causa da sua insistência em discutir
publicamente os escândalos dos banqueiros gregos. “Em conjunto, estes três
factores fizeram-me achar que era tempo de abandonar outra vez a Grécia.” Em
2012, Varoufakis e Danae vão viver para Austin, nos Estados Unidos. Yanis dá
aulas na Universidade do Texas, na escola de Políticas Públicas Lyndon B.
Johnson. Danae dedica-se aos seus projectos de artista plástica, principalmente
às instalações. “Temos as antenas constantemente viradas para a pátria que
deixámos para trás. Temporariamente, esperamos.”
Varoufakis está
habituado a viver fora do país. Estudou em Essex, no Reino Unido, deu aulas na
Escócia, na Austrália e nos Estados Unidos. Mas o tempo de emigração por causa
da crise só terminará quando ouve o “chamamento” de Alexis Tsipras para se
candidatar a deputado pelo Syriza. O homem que já no início do ano 2000 começou
a prever o risco da zona euro (“escrevi muitos artigos mas ninguém ligava
nenhuma”) abandonou o seu cargo na Universidade de Texas porque “não podia
recusar” juntar-se ao Syriza. Danae continua em Austin, fazendo e desfazendo
tapeçarias-instalações enquanto o marido faz de Ulisses e corre a Europa em
busca de uma solução que nem ele próprio sabe se será possível. Não, Ulisses é
pouco. Foi Yanis Varoufakis que disse que, comparado com o que o espera, a
Odisseia de Ulisses é um passeio no parque.
In ionline.pt
Por Ana Sá Lopes
Quer conhecer melhor este economista
que tem medo de ser político?
Lola