O MEU DISCURSO DA REPÚBLICA
Homens e Mulheres da
República!
O
Tempo, esta categoria do humano, passa, a Natureza desenvolve-se, o Homem vive
e descobre o que o rodeia num movimento incessante. Mas, como em qualquer ser
vivo, a vida tem um fim que, inevitavelmente, nos envolve. Tudo se transforma em
momentos fugidios que jamais serão vividos. A História, a História tão
sentidamente vivida, permanece, apesar de tudo, na memória das gerações vindouras.
Nos
últimos cem anos, o Homem desenvolveu-se como nunca os seus antepassados
imaginaram, questionando os limites daquilo que poderia ser alcançado. Com cem
anos escreve-se a História, transforma-se uma Nação, criam-se condições para
estarmos aqui hoje, como povo livre, igual e fraterno, comemorando o 5 de Outubro
de 1910.
É
que ao comemorar, hoje, o centenário da República, estamos, também, a fazer a
História de uma Nação inovadora que, permanentemente, vive em nós com o nome de
Portugal.
Minhas Senhoras e
meus Senhores,
Olhar
o passado das nossas gentes é algo de que nos devemos orgulhar! Cedo, os
portugueses se assumiram como povo determinado em viajar para além do horizonte
sensorialmente apreendido, numa ambição
desmedida, numa vontade ousada, com um esforço
inigualável e uma inteligência sublime, lutando
pela sua independência conquistando territórios longínquos e descobrindo mundos
desconhecidos, repletos de mistérios a explorar.
A
História de um país, tal como a vida de cada um de nós, é feita de desalento e
de esperanças continuamente repensadas e prementemente desejadas. Assim, o período
monárquico trouxe consigo muitas insatisfações e um grande descontentamento da
população, pelas dificuldades sofridas na disparidade entre operários, agricultores e
trabalhadores rurais e os muito ricos que
conseguiam aumentar a sua fortuna numa desigualdade de oportunidades
demasiadamente imoral porque exageradamente desumana.
Três
décadas de grande revolta e propaganda republicana geraram uma crescente instabilidade
no Regime Monárquico. No dia 1 de Fevereiro de 1908, D. Carlos morre num
atentado em Lisboa, sucedendo-lhe D. Manuel II. Passados dois anos,
iniciar-se-ía a primeira grande
revolução portuguesa do século XX.
O movimento revolucionário partiu de pequenos
grupos de conspiradores: membros do exército e da marinha, alguns dirigentes
civis e grande número de populares armados. Apesar de alguma resistência e
alguns confrontos militares, o exército fiel à monarquia não conseguiu
organizar-se de modo a derrotar os revoltosos. A revolução saiu vitoriosa.
É
então que na manhã de 5 de Outubro de
1910, José Relvas e outros membros do Directório do Partido Republicano
Português, à varanda da Câmara Municipal de Lisboa e perante milhares de
pessoas, proclamaram a República que terminava um período monárquico em Portugal:
em lugar do rei que, por mero critério hereditário,
ocupa o poder desenha-se a alvorada da República, em que o presidente, eleito livremente
pelos Portugueses, pode governar o País.
Numa
Europa marcadamente conservadora e predominantemente monárquica, Portugal
desenha um quadro de alterações: da bandeira à moeda, do hino à reforma
ortográfica, de um centralismo à participação livre dos cidadãos na vida do seu
país.
O
regime republicano, implantado em 1910, inspirou-se nos ideais da Revolução Fancesa:
liberdade igualdade e fraternidade. A
república reforçou o parlamentarismo e a afirmação dos direitos, liberdades e
garantias individuais. O poder republicano consagrou os princípios
constitucionais do novo regime num texto elaborado por uma Assembleia Nacional
eleita no ano seguinte: a Constituição de 1911.
E
porque a história dos povos também se constrói nas adversidades sentidas, não
esquecemos o período de grande instabilidade governativa que durante a 1ª
República, entre 1910 e 1926, Portugal viveu e as sequelas da 1ª Guerra Mundial que acentuaram
a crise do parlamentarismo da 1ª República, levando-a a sucumbir a um golpe militar em 1926,
estabelecendo-se o Estado Novo.
A
República viveria doravante, e por cerca de cinco décadas, o seu lado lunar: De
Salazar a Marcello Caetano, da existência de um partido político oficial, a
União Nacional, que transmitia o “espírito da Nação” a uma oposição duramente reprimida. Da
censura dos media que impedia a contestação ao regime, à tristemente memorável e
temida polícia política que perseguia todo e qualquer opositor ao regime.
Com
uma ideologia marcadamente conservadora, o Estado Novo orientava-se segundo os
princípios consagrados pela tradição: Deus, Pátria, Família, Autoridade,
Hierarquia, Moralidade, Paz Social e Austeridade.
Usou
como instrumentos de eternização a criação de milícias, uma para defesa do
regime e combate ao comunismo, a Legião Portuguesa; outra destinada a inculcar
nos jovens os valores do regime, a Mocidade Portuguesa.
Toda
a vida económica e social do país foi organizada em corporações. O
corporativismo estabelecia um maior controlo do Estado sobre as actividades
económicas dificultando a existência de
sindicatos.
Uma
política teimosamente colonialista, que afirmava Portugal como um Estado
pluricontinental e multirracial, originaria a partir de 1961, já com muitas
pressões internacionais para que o país concedesse a independência às suas colónias, uma das
páginas mais negras da nossa história: a Guerra Colonial.
Portugal
condescendia a uma política nacionalista alargada a vários níveis e, sobretudo,
marcada pela máxima: “ Estamos
orgulhosamente sós”.
Este
país, que é nosso, viveu mergulhado na pobreza incompreensível, na tristeza
inexplicável e no medo perturbador. Durante mais de 40 anos, a ditadura
escureceu a esperança de um povo que se exilava, que ansiava por eleições livres e exigia alternativas de
pensar a vida colectiva. Pessoas sedentas de liberdade para expressar pensamentos sobre um país que sentiam poder afirmar-se com
dignidade. Muitos se sentiram vigiados, alguns foram presos simplesmente por
acreditarem na utopia, uns tantos viveram a experiência amarga da tortura em espaços dolorosamente relembrados.
Até
que, por entre o adormecer inconformado da ditadura e os primeiros raiares de
Sol, amanhece Abril! De cravos vestidos de vermelho e cuidadosamente colocados em
espingardas de contestação apontadas a futuros de liberdade, milhares de vozes
abraçam uma revolução que acorda ao som de uma canção pintada de liberdade.
Um
grupo de navegadores parte, mais uma
vez, em busca de um Portugal diferente. Salgueiro
Maia e os capitães de Abril, sonham um país de liberdade, de desenvolvimento,
de igualdade de oportunidades – um país de um novo Abril de esperança.
De
novo se proclama a Republica!
Não
vivi Abril! Sinto-o, no entanto, nas
expressões de mudança deste Portugal que se quer uma construção contínua pela
participação de todos que o constituem. Sou um adolescente que acredita na
força dos jovens deste país capaz de potenciar novas oportunidades de
desenvolvimento nas letras, nas artes e nas ciências. A juventude entrelaça o
Passado no Futuro que continuadamente projecta, assumindo-se como alicerce fundamental da sociedade a construir
e que pede uma regeneração ética, estética e axiológica!
Novos
desafios se nos apresentam: a responsabilidade pelo planeta, o desenvolvimento
sustentável, a luta contra a pobreza, o cuidado e o respeito pelo outro, o
progresso social e a aposta na cultura, na educação, na investigação e no empreendedorismo.
Saibamos, por isso, acreditar!
Cidadãos da República,
Se
a constuição de 1822 definia a Nação Portuguesa como “A união de todos os
portugueses de ambos os hemisférios”, hoje podemos afirmar que este é o país
que se abre à Europa e ao mundo, que acredita nas potencialidades dos seu povo,
um país que se afirma como um espaço de convivência multicultural, de respeito
pelos diferentes credos religiosos e por novas formas de relacionamento interpessoal.
Estes
são tempos que exigem atitudes de debate e reflexão pelas opções políticas,
pessoais e sociais face a desafios de uma sociedade que nos envolve. Façamos da
tolerância um princípio e do respeito uma exigência!
Urge
reconhecer a importância da aposta na formação académica e na educação dos
jovens que, preparando o seu futuro, contribuem e desenvolvem o país que os
abraça em valores republicanos num respeito exigido pelo legado dos nossos
antepassados.
Saibamos,
por isso, merecer e perpetuar a grandiosidade de um Portugal ido, de Camões, de Eça e de Pessoa construindo um país de esperança, neste que é
um Portugal moderno de Oliveira, de Pomar e de Saramago.
Enfrentamos
Adamastores! Não tememos o desconhecido confirmando a brava ambição de
guerreiros lusitanos! Nós que nos sentimos povo livre, de força desmedida, de
coragem inquebravel, seremos, com certeza, uma Nação de futuro, um povo
solidário, sedento de aventura e utopia.
Herdeiros de
bravos navegadores quinhentistas destemidos face a obstáculos temerosos, afirmemo-nos
como povo de esperança continuada – um país com SAUDADE do futuro. Esta Saudade
que é só nossa!
Viva a
República! Viva Portugal!
Tiago Fontes Mendes e Rosa Sousa
Lola