Valor e Filosofia
Haverá tipos de valores?
Embora tradicionalmente a axiologia considere três tipos de valores - estéticos, éticos e religiosos - estudados, respectivamente pela estética, ética e filosofia da religião, no século XX vários filósofos estudaram a problemática da classificação dos valores.
Max Scheler (1874 - 1928) apresentou uma classificação dos valores, ou seja, uma Tábua de Valores:
- Valores religiosos (sagrado/profano)
- Valores éticos ou morais (bom/mau)
- valores estéticos (belo/feio)
- valores lógicos(verdade/falsidade)
- valores vitais (forte/fraco)
- valores úteis (abundante/escasso)
Segundo o filósofo os valores religiosos, quando presentes na vida do homem, são mais importantes, mais valiosos que os valores éticos!
E para o homem ateu?
Será que a maioria dos homens defenderia os valores éticos em detrimento dos valores úteis?
E abdicaria dos éticos em função dos religiosos?
Será que esta perspectiva é criticada?
Classificação dos valores.
Vamos tomar provisoriamente uma classificação
que anda por aí e que é provavelmente a menos incorreta, a mais aceitável de
todas, que é a classificação de Scheler no seu livro O formalismo na
ética e a ética material dos valores.
Segundo esta
classificação, poder-se-iam agrupar os valores nos seguintes grupos ou classes:
primeiro, valores úteis; por exemplo, adequado, inadequado, conveniente,
inconveniente.
Depois, valores vitais; como, por exemplo, forte, fraco.
Valores
lógicos, como verdade, falsidade.
Valores estéticos, como belo, feio sublime,
ridículo.
Valores éticos, como justo, injusto, misericordioso, despiedado
E,
por último, valores religiosos, como santo, profano.
Pois bem; entre essas classes ou grupos de
valores existe uma hierarquia.
Que quer dizer esta hierarquia?
Quer dizer que os valores religiosos afirmam-se superiores aos valores éticos; que os valores éticos, afirmam-se superiores aos valores estéticos; que os valores estéticos afirmam-se superiores aos lógicos, e que estes por sua vez se afirmam superiores aos vitais, e estes por sua vez superiores aos úteis.
Quer dizer que os valores religiosos afirmam-se superiores aos valores éticos; que os valores éticos, afirmam-se superiores aos valores estéticos; que os valores estéticos afirmam-se superiores aos lógicos, e que estes por sua vez se afirmam superiores aos vitais, e estes por sua vez superiores aos úteis.
E este
afirmar-se superior, que quer dizer?
Pois quer dizer o seguinte, nada mais que
o seguinte: que se esquemáticamente assinalarmos um ponto com o zero para
designar o ponto de indiferença, os valores, seguindo sua polaridade,
agrupar-se-iam à direita ou à esquerda deste ponto em valores positivos ou valores
negativos e a maior ou menor distância do zero. Uns valores, os úteis, se
afastarão se desviarão pouco do ponto de indiferença; estarão próximos do ponto
de indiferença. Outros valores, o grupo seguinte, os vitais, se afastarão algo
mais do ponto de indiferença. Quer dizer, que postos a escolher entre
sacrificar um valor útil ou sacrificar um valor vital, sacrificaremos com mais
gosto o valor útil que o valor vital, porque a distância em que se acham os
valores úteis é mais próxima do ponto de indiferença. Menos nos importa jogar
pela janela um saco de batatinhas que sacrificar um valor vital, por exemplo,
um gesto bizarro. Mas estes valores vitais, por sua vez importam-nos menos que
os valores intelectuais. Quer dizer, que os valores intelectuais se afastam
mais do ponto de indiferença e são ainda menos indiferentes que os valores
vitais, e assim sucessivamente.
Se nós tivermos que optar entre salvar a vida
de uma criança, que é uma pessoa, e, portanto, contém valores morais supremos,
ou deixar que se queime um quadro, preferiremos que se queime o quadro.
Haverá
quem não tenha a intuição dos valores estéticos e então preferirá salvar um
livro de uma biblioteca antes do que um quadro. Isto é o que quer dizer a
hierarquia dos valores.
No ápice das hierarquias coloca Scheler os
valores religiosos.
Que quer dizer isto?
Pois quer dizer que para quem não seja cego aos valores religiosos (coisa que pode acontecer), para quem tenha a intuição dos valores religiosos estes têm hierarquia superior a todos os demais. Desta maneira chegamos a esta última categoria estrutural ontológica da esfera dos valores: a hierarquia,
Que quer dizer isto?
Pois quer dizer que para quem não seja cego aos valores religiosos (coisa que pode acontecer), para quem tenha a intuição dos valores religiosos estes têm hierarquia superior a todos os demais. Desta maneira chegamos a esta última categoria estrutural ontológica da esfera dos valores: a hierarquia,
E agora, para terminar vão duas observações
de relativa importância para dar por terminada esta caminhada pela esfera dos
valores.
A primeira observação é a seguinte: um estudo
detido, pormenorizado, profundo, de cada um destes grupos de valores que vimos
na classificação pode e deve servir de base — ainda que isto não o percebam
os escritores cientistas — a um grupo ou a uma ciência correspondente a
cada um desses grupos. De modo que, por exemplo, a teoria pura dos valores
úteis constitui o fundamento da economia, saibam-no ou não os economistas. Se
os economistas percebessem isto e estudassem a axiologia antes de começarem propriamente sua ciência
e económica e esclarecessem seus conceitos do valor útil, então veríamos
quanto melhor fariam a ciência económica.
Depois vêm os valores vitais. Pois bem; de
que achamos falta, desde tantos anos, na ciência contemporânea, senão de um
esclarecimento exato dos valores vitais que permitiria introduzir pela primeira
vez método e clareza científica num grande número de problemas que andam
dispersos por diferentes disciplinas e que não se sabe como tratar? Somente
alguns espíritos curiosos e raros deles trataram. Por exemplo: a moda, a
indumentária, a vestimenta, as formas de vida, as formas do trato social, os
jogos, os desportos, as cerimonias sociais etc. Todas essas coisas têm que ter
sua essência, sua regularidade própria, e, não obstante, hoje, ou não estão
estudadas em absoluto ou estão em livros curiosos ou estranhos como alguns ensaios de
Simmel ou em notas ao pé das páginas. E, não obstante, constituem todo um
sistema de conceitos cuja base está num estudo detido dos puros valores vitais.
O resto é bem evidente. É bem evidente que o
estudo detido dos valores lógicos serve de base à lógica. É evidente também que
o estudo detido daquilo que são os valores estéticos serve de base à estética.
É evidente também que o estudo dos valores morais serve de base à ética. E
disto não há queixa, porque, efectivamente, na filosofia contemporânea a lógica,
a estética e a ética têm fundamento numa prévia teoria desses valores.
Do mesmo modo a filosofia da religião não
pode fundar-se senão num estudo cuidadoso, detido, dos valores religiosos. E
hoje começa a haver também na literatura filosófica contemporânea uma filosofia
da religião fundada na base de um prévio estudo dos valores religiosos. E posso citar um nome tanto mais grato quanto está por suas crenças religiosas
muito próximo de nós — Gründler — que escreveu um ensaio sobre Filosofia da
religião sobre a base feno-ontológica, quer dizer, sobre um estudo dos valores
religiosos. Esta é a primeira observação.
A segunda observação enlaça-se com o que
dizíamos na lição anterior refutando energicamente àqueles que acusam a
ontologia contemporânea de partir em dois ou em três a unidade do ser.
Relembre-se que tivemos de prestar atenção a essas críticas, segundo as quais
distinguir o ser em ser real, ser ideal etc, é renunciar à unidade do ser.
Relembre-se o que tivemos que responder àquelas críticas. Tivemos que fazer ver
àqueles críticos que na série das categorias do ser real a primeira era o ser;
e na série das categorias do ideal, a primeira era também o ser, e que, portanto,
essa distinção ou divisão não atingia a raiz ontológica do ser, mas suas
diversas modalidades. Agora deparamos com essa mesma crítica quando chegamos ao
campo dos valores; porque nos dizem: vocês dividem_ aquilo que há em duas
esferas incomunicadas: as coisas que são e os valores que vocês chegam a dizer
que não são, mas que valem. Porém á ingénua esta crítica e pode dar-se por
respondida.
Os valores não são, os valores valem
Os valores não são, os valores valem
Precisamente porque os valores não são é que não atentam nem
menoscabem em nada a unidade do ser. Dado que não são, mas que valem, que são
qualidades necessariamente de coisas, estão necessariamente aderidos às coisas.
Representam aquilo que na realidade há de valer. Não somente não se menoscaba
nem se parte em dois a realidade mesma, antes, ao contrário, integra-se a
realidade; dá-se à realidade isso: valer. Em troca, não a diminui nem a divide.
Precisamente porque os valores não são entes, antes qualidades de entes, sua
homogenea união com a unidade total do ser não pode ser posta em dúvida por
ninguém. Teria que ser posta em dúvida se nós quiséssemos dar aos valores uma
existência, um ser próprio, distinto do outro ser. Porém não fazemos
tal, antes, ao contrário, consideramos que os valores não são, mas
representam simples qualidades valiosas, qualidades valiosas; de quê? Pois das
coisas mesmas. Aí está a fusão completa, a união perfeita com todo o restante
da realidade.
Aliás, este problema da unidade do real é um
problema ao qual ainda não posso dar uma resposta plenamente satisfatória, por
uma razão: porque ainda nos resta o último objeto. Resta-nos por estudar o
último objecto daqueles em que dividimos a ontologia, e este último objeto,
precisamente é aquele que tem no seu seio a raiz da unidade do ser. Resta-nos
por estudar a vida como objecto metafísico, como recipiente em que há tudo isso
que enumeramos: as coisas reais, os objectos ideais, e os valores. Resta-nos
ainda a vida como o recipiente metafísico, como o estar no mundo. É essa
unidade ou objeto metafísico, que é a vida, que estudaremos na próxima lição; e
nela, então, encontraremos a raiz mais profunda dessa unidade do ser.
Fundamentos de Filosofia
de Manuel Garcia Morente
Lições Preliminares
Que sentido assume o conceito de valor em Filosofia?
Quando se aborda o conceito de valor, em Filosofia, estamos a referir-nos a atitudes e preferências do homem.
Em Filosofia, o valor não tem carácter materialista ou substancialista!
Não serão os valores éticos aqueles que deveremos colocar no topo?
E o menino faminto de África colocará os valores éticos no topo?
E o menino faminto de África colocará os valores éticos no topo?
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