Exames e ansiedade
Como evitar a ansiedade em véspera de
exames nacionais? E como superar uma branca na hora H? Estudar é
imprescindível, mas respirar fundo, comer bem e dormir ainda melhor é fundamental.
Andam a estudar há 12 anos (ou mais) e
fizeram já centenas de testes, mas a verdade é que em vésperas de exames
nacionais do ensino secundário muitos alunos não conseguem controlar a
ansiedade e temem as famosas “brancas” durante a realização das provas. O
Observador foi ouvir três psicólogas que deixam um conjunto de dicas e
sugestões para os jovens e também para os pais. Na dúvida, e em momentos de
pânico, respire fundo.
Imagine que está a meio de um exame e,
de repente, tem a sensação de que tudo aquilo que andou dias a estudar se
apagou da memória. Tem uma “branca”. O truque nesse momento é tentar ficar
calmo e passar a mensagem ao cérebro de que não está perante uma situação de
perigo.
O ideal é, por isso, parar,
fechar os olhos, focar-se no coração, senti-lo, visualizá-lo e imaginar que
está a respirar pelo coração, que o ar passa por lá. O último passo é pensar em
alguma coisa fofinha, positiva e divertida.
O chamado exercício da
“coerência cardíaca” ou “freeze-frame” é ensinado pelas psicólogas
Cristina Ferreira e Susana Cheis aos jovens que lhes passam pelas consultas. É
que, controlando a respiração, influenciamos os batimentos cardíacos e a
atividade cerebral.
“Bastam 30 segundos a respirar
devagarinho e sempre pelo nariz — porque se estiver a respirar
pela boca esse é o meu estado de exercício físico ou fuga. Se tiver os ombros
para trás, relaxados, a cabeça direita e a respirar devagarinho o meu cérebro
vai achar que está tudo bem. Aliado a isso, se pensarmos numa coisa boa ou
divertida ou fofinha produzimos os neurotransmissores fundamentais para o
momento”, aconselha a psicóloga Cristina Ferreira.
A sugestão é que se inspire em sete
tempos e expire em 11, ou numa proporção de cinco para sete ou três para cinco.
E se mesmo assim não resultar? “Podem
fazer a pesca indireta. Imagine que estão a fazer um exame de
matemática, devem pensar quem é a professora de matemática, quem se senta ao
lado deles na mesa, em que sala costumam ter aulas. E isto sempre em estado de
relaxamento. Ou então podem pensar em que sítio é que estudaram matemática, ou
que música estavam a ouvir”, sugere a psicóloga, aconselhando “que tudo seja
feito sempre a sorrir e em estado de relaxamento”. E pensando em coisas
positivas, como as férias que estão aí à porta.
“Bastam 30 segundos a respirar devagarinho e sempre pelo nariz — porque se
estiver a respirar pela boca esse é o meu estado de exercício físico ou fuga.
Se tiver os ombros para trás, relaxados, a cabeça direita e a respirar
devagarinho o meu cérebro vai achar que está tudo bem. Aliado a isso, se
pensarmos numa coisa boa ou divertida ou fofinha produzimos os
neurotransmissores fundamentais para o momento.”
Cristina Ferreira, psicóloga
Levar água para a prova é também
essencial: “O cérebro não hidratado não raciocina”. Susana Cheis e Teresa Andrade reforçam, igualmente, a importância da
hidratação durante o estudo e a realização dos exames.
Outro truque para evitar as “brancas”
durante as provas é responder primeiro a todas as perguntas que se
sabe. Mas Susana Cheis lembra que isto não funciona com todos os
alunos: “Para muitos não é bom porque podem ver que há muitas que não sabem
responder ou podem ficar assustados com a dimensão do exame. Também podem ter
medo de não conseguir voltar atrás para fazer as perguntas que saltaram”.
Para acalmar e aprender é fundamental dormir
A verdade é que a “branca” durante o
exame pode ser evitada se o aluno conseguir controlar a ansiedade da véspera. E
isso é possível pensando, desde logo, que a realização do exame é um momento
importante mas não perigoso. Há, na verdade, vários comportamentos que podem
ser adotados para superar esta fase com uma maior tranquilidade.
Teresa Andrade, que é também professora
associada na área de Psicologia Educacional no Instituto Superior de Saúde Egas
Moniz, começa por afirmar que “os jovens devem descansar entre períodos de
estudo”. “Está provado que dormir entre períodos de estudo, mesmo que seja só
30 minutos, aumenta a capacidade de aprender. Dormir bem é fundamental para
aprender melhor.”
E porquê? “Porque é essencial para a
memória e para a concentração, para a memória a curto e longo prazos e para o
equilíbrio emocional e a gestão de stress”, explica Susana Cheis, aconselhando
os jovens a dormir “pelo menos nove horas e durante a noite, evitando
as loucuras das diretas e horas a fio a estudar”.
“Está provado que dormir entre períodos de estudo, mesmo que seja só 30
minutos, aumenta a capacidade de aprender. Dormir bem é fundamental para
aprender melhor.”
Teresa Andrade, psicóloga e professora associada na área de Psicologia
Educacional no Instituto Superior de Saúde Egas Moniz
Já Cristina Ferreira fica-se pelas oito
horas de sono nas recomendações que faz aos jovens e explica a razão:
“Ao fim dos primeiros 90 minutos de sono temos nove minutos de REM [sigla em
inglês que significa movimento rápido dos olhos e que corresponde ao pico da
atividade cerebral], ao fim dos segundos 90 minutos temos 18 minutos REM e por
aí em diante. Assim, entre a sétima e a oitava horas de sono temos uma
hora de processamento de informação completa”.
E “mesmo durante o dia se der muito sono
deve dormir-se 30 minutos a uma hora, porque assim a informação vai passar para
a memória de longo prazo. O que estudamos durante o dia não dura mais
de 24 horas”, frisa Cristina Ferreira.
Um bife ao pequeno almoço, apanhar sol e fazer exercício… físico
A alimentação é outra componente
fundamental a ser tida em conta pelos jovens e pais nesta altura do campeonato.
“Beber muita água e comer bem (frutos secos, fruta, proteína e vegetais) também
ajuda o cérebro a resistir melhor à ansiedade”, garante a professora do
Instituto Superior de Saúde Egas Moniz Teresa Andrade.
E seguindo o conselho da boa
alimentação, no dia do exame os jovens devem tomar um bom pequeno almoço.
Deve ser rico em proteínas, como ovos
mexidos com fiambre ou um bife acompanhado de legumes ou leguminosas, pois são
fontes de energia mais duradouras e frutos secos para o cérebro, que precisa
sempre de fontes de energia adicionais”, sugere a psicóloga Teresa Andrade.
E Susana Cheis deixa ainda outra dica:
“É muito importante apanhar sol durante o dia e fazer
exercício físico com regularidade. Há muitas crianças que deixam de ir às
atividades para estudar e deve ser o contrário. Está provada a
importância do exercício físico: ao fim de 20 a 25 minutos de exercício
alteramos o estado hormonal e oxigenamos o cérebro todo“.
"Há muitas crianças que deixam de ir às atividades para estudar e deve
ser o contrário. Está provada a importância do exercício físico: ao fim de 20 a
25 minutos de exercício alteramos o estado hormonal e oxigenamos o
cérebro todo.“
Susana Cheis, psicóloga
Mas as dicas não se ficam apenas pela
parte física. Também os pensamentos devem estar alinhados com o corpo. “A
linguagem deve ser sempre positiva. Os alunos devem focar-se no pensamento de
que se trata apenas de mais uma etapa de aprendizagem, que vale o que vale”,
sugere Susana Cheis, explicando que “quanto maior o peso atribuído, mais
difícil se torna”.
Não só devem pensar que se trata de
“mais uma etapa pela qual todos passam” como “são novos” e “têm muito tempo
pela frente”, acrescenta Cristina Ferreira, sublinhando que não se deve “desvalorizar,
mas antes desdramatizar e afastar o pensamento de ameaça” que surge da pressão
imposta quer por professores como pelos pais.
“Se não correr bem, repetem. Os alunos
devem compreender que é apenas um exame, não estão doentes nem o mundo está a
acabar”, corrobora Teresa Andrade.
Andar, ouvir música ou usar cores. As estratégias mudam de aluno para aluno
Claro que o sucesso não se alcança sem
estudo e também para estudar há truques que podem ser usados e que variam de
aluno para aluno. Não basta apenas ficar horas a ler a matéria.
“Os mais auditivos podem pôr música de
fundo e, de preferência, diferente para cada disciplina porque isso pode
ajudá-los mais tarde durante a realização das provas caso tenham uma branca. Os
mais visuais podem escrever em folhas coloridas ou com canetas de cores
diferentes para cada disciplina e os cinestésicos podem estudar a andar e
escolher um sítio diferente consoante a disciplina que estão a estudar ou usar
velas com cheiros diferentes ou perfumes”, propõe Cristina Ferreira.
Um conselho que é subscrito por Teresa
Andrade. “Há alunos que memorizam melhor a escrever, sublinhar ou fazer
esquemas, outros a ouvir e que estudam bem com música ou a falar em voz alta e
depois temos os que gostam de estar mais ativos fisicamente enquanto aprendem e
que se estudarem a andar ou a comer ou a mastigar uma pastilha ou rebuçado
aprendem melhor porque precisam de se movimentar.”
A psicóloga Cristina Ferreira enfatiza
ainda a importância de fazer pausas ao longo do estudo: a cada 40 minutos
a uma hora devem parar cinco a 10 minutos ou 15 a 20 ao final de 90 minutos. “Podem
e devem aproveitar para ver coisas cómicas por exemplo no Youtube.”
Pais devem aliviar a pressão
Sendo que a pressão dos filhos é, muitas
vezes, transmitida ou empolada pelos pais — mesmo que de forma involuntária –,
as três psicólogas ouvidas pelo Observador deixam conselhos aos progenitores.
A melhor forma de lidar com os jovens
nestes períodos de exames nacionais é, segundo Cristina Ferreira, “passar a
mensagem de que acreditamos neles e na capacidade de gerirem o tempo e
encontrarem o ritmo de trabalho, mostrando total disponibilidade para ajudar em
caso de necessidade”. Mostrar compreensão também é importante.
“Não se deve desvalorizar o esforço,
porque o jovem vai sentir-se incompreendido. Devemos dizer: ‘Ok, tens
razão, é uma altura de pressão, também estaria nervoso no teu lugar, mas terias
vantagens se te acalmasses'”, sugere a psicóloga Cristina Ferreira.
“Não se deve desvalorizar o esforço, porque o jovem vai sentir-se
incompreendido. Devemos dizer: ‘Ok, tens razão, é uma altura de pressão, também
estaria nervoso no teu lugar, mas terias vantagens se te acalmasses'."
Cristina Ferreira, psicóloga
Proporcionar esse ambiente “calmo e
harmonioso” é, de resto, uma das maneiras dos pais ajudarem os filhos, sublinha
Teresa Andrade, que entrega aos pais outra função: “Devem ajudar o
jovem a alternar o trabalho com descanso, a alimentar-se bem e a não fazer
diretas“. A professora do Instituto Superior de Saúde Egas Moniz defende
que os pais devem “estimular sem pressionar”, “elogiando o esforço” e mostrando
disponibilidade “para ouvir ou fazer perguntas”.
Na mesma linha de pensamento, a
psicóloga Susana Cheis destaca a mensagem de que os pais devem perguntar aos
filhos se precisam de ajuda e procurar perceber como se sentem, mas “sem
colocar pressão”, frisando a ideia de que “o mais importante não são os
testes, mas o bem-estar deles”.
Marlene Carriço
in Observador
de 18 de junho de 2017
Lola
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