Marisa Pires, subcomissária da PSP, 27 anos |
Relativismo cultural – James Rachels
O relativismo cultural, como tem sido chamado,
desafia a nossa crença habitual na objetividade e universalidade da verdade
moral. Afirma, com efeito, que não existe verdade universal em ética; existem
apenas os vários códigos morais e nada mais. Além disso, o nosso próprio código
moral não tem um estatuto especial: é apenas um entre muitos. […]
A primeira coisa que precisamos de fazer notar é
que no âmago do relativismo cultural está uma certa forma de argumento. A
estratégia usada pelos relativistas culturais é argumentar, a partir de factos
sobre as diferenças entre perspetivas culturais, a favor de uma conclusão sobre
o estatuto da moralidade [como se segue].
1. Culturas diferentes têm códigos morais
diferentes.
2. Logo, não há uma «verdade» objetiva na
moralidade. Certo e errado são apenas questões de opinião e as opiniões variam
de cultura para cultura.
Podemos chamar a isto o argumento das diferenças
culturais. Para muitas pessoas é persuasivo. Mas, de um ponto de vista lógico,
será sólido? Não é sólido. O problema é que a conclusão não se segue da
premissa – isto é, mesmo que a premissa seja verdadeira, a conclusão pode
continuar a ser falsa. A premissa diz respeito àquilo em que as pessoas
acreditam – em algumas sociedades as pessoas acreditam numa coisa; noutras
sociedades acreditam noutra. A conclusão, no entanto, diz respeito ao que na
verdade se passa. O problema é que este tipo de conclusão não se segue
logicamente deste tipo de premissa. […]
Para tornar este aspeto mais claro, considere-se um
tema diferente. Em algumas sociedades as pessoas acreditam que a Terra é plana.
Noutras sociedades, como a nossa, as pessoas acreditam que a Terra é
(aproximadamente) esférica. Segue-se daqui, do mero facto de as pessoas
discordarem, que não há «verdade objetiva» em geografia? Claro que não; nunca chegaríamos
a tal conclusão, porque percebemos que, nas suas crenças sobre o mundo, os
membros de algumas sociedades podem simplesmente estar errados. Não há qualquer
razão para pensar que se o mundo é redondo, todos têm de saber disso. Da mesma
maneira, não há qualquer razão para pensar que, se existe uma verdade moral,
todos têm de conhecê-la. O erro fundamental no argumento das diferenças
culturais é que tenta derivar uma conclusão substancial sobre um tema partindo
do mero facto de as pessoas discordarem a seu respeito.
James Rachels, Elementos de Filosofia Moral,
trad. port.
F. J. Azevedo Gonçalves, Lisboa,
Gradiva, 2002, pp. 36-39
Lola
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