sábado, 27 de junho de 2020

Filosofia da Religião: Fideismo de Pascal - exercicios




O Fideismo de Pascal- exercícios

Ouça a seguinte ENTREVISTA


Guião de audição da entrevista I

1. De que problemas trata a filosofia da religião?
2. Explica brevemente o argumento a favor da existência de Deus referido na
entrevista.
3. Explica brevemente que objeção principal se poderá apresentar a esse
argumento.
4. Qual é a distinção entre racionalidade prudencial e racionalidade epistémica?
5. Por que razão se pode dizer que a crença religiosa tem racionalidade
prudencial?

Guião de audição da entrevista II

6. Por que razão se pode dizer que a crença religiosa tem racionalidade
epistémica?
7. Que críticas se podem apresentar à racionalidade prudencial e epistémica da
crença em Deus?
8. Qual é o argumento principal para se colocar Deus em causa? Explique
brevemente esse argumento.
9. De que forma se pode criticar esse argumento contra a existência de Deus?
10. De que forma o desacordo religioso coloca em causa a crença religiosa?



Respostas – Ficha de Trabalho – Parte I

1. Que problemas trata a filosofia da religião?
A filosofia da religião consiste em pensar filosoficamente sobre tópicos que surgem quando o assunto é a religião. Ou seja, podemos caracterizar a filosofia da religião como o exame de conceitos religiosos fundamentais (como o conceito de Deus e de fé) e de crenças religiosas fundamentais (tal como a crença de que Deus existe e de que a existência do mal é de algum modo consistente com o amor de Deus pelas suas criaturas). Importantes problemas da filosofia da religião são os seguintes: Será que Deus existe? Será que o mal é uma forte razão contra a existência de Deus? Será racional acreditar em Deus ou ter fé sem provas ou argumentos?

2. Explique brevemente o argumento a favor da existência de Deus referido na entrevista.
O argumento a favor da existência de Deus referido na entrevista é o argumento da “afinação minuciosa”. A ideia central do argumento é a seguinte: parte-se das descobertas da física cosmológica que mostram que muitas das mais básicas forças ou parâmetros na natureza (tal como a força nuclear forte, a força da explosão inicial do big bang, a massa de protão e neutrão, a velocidade da luz, entre muitas outras) são tais que, se fossem ligeiramente diferentes, a vida seria impossível. Assim, alguns físicos concluíram que esses parâmetros do universo estão minuciosamente afinados para a vida. Ora, tendo em conta esses dados ou evidências, temos as seguintes hipóteses: essa afinação minuciosa do universo deve-se a um designer sobrenatural, i.e., a um Deus. Ou, pelo contrário, a afinação minuciosa do universo é fruto do acaso. Com base nestas informações, pode-se sustentar que se o universo fosse resultado do mero acaso, seria surpreendente ele ter aquelas características e padrões minuciosamente afinados para a vida. Todavia, se o universo fosse o resultado de um designer sobrenatural, não seria surpreendente ele ter aquelas características e padrões. Daqui se segue que é mais provável que o universo tenha padrões ou constantes minuciosamente afinadas para a vida se houver um designer do que se for fruto do acaso. Mas, então, pode-se concluir que os dados ou a evidência disponível confirmam a hipótese de um designer sobrenatural (ou seja, de Deus) em detrimento da hipótese rival (ou seja, o acaso).

3. Explique brevemente que objeção principal se poderá apresentar a esse argumento.
Como crítica ao argumento da “afinação minuciosa” pode-se sustentar que não há apenas duas hipóteses (Deus e o acaso), mas há igualmente uma terceira hipótese, a hipótese do multiverso, ou seja, existem muitos universos distintos com constantes físicas ou leis naturais diferentes. Assim entre os vários universos, acabará por surgir por acaso um universo em que as constantes assumem os valores “corretos” para a existência de vida. Admitida esta pluralidade de universos, a afinação minuciosa não será surpreendente.

4. Qual é a distinção entre racionalidade prudencial e racionalidade epistémica?
Quando se discute se a crença em Deus ou fé é racional na ausência de argumentos é preciso esclarecer o que se entende por “racional”. Uma distinção básica é entre racionalidade prudencial e racionalidade epistémica. A primeira, a prudencial, é o tipo de racionalidade que justifica crenças que são práticas ou que ajudam o sujeito de alguma forma. Assim, este tipo de racionalidade, ainda que não seja conducente à verdade, é conducente a benefícios práticos para o sujeito. A segunda, a epistémica, é o tipo de racionalidade que é tendencialmente conducente à verdade. De uma forma geral, é a propriedade que é necessária e, quando adicionada à crença verdadeira, é suficiente, ou próxima de ser suficiente, para o conhecimento. Ou seja, é o elemento da “justificação” na definição tradicional de conhecimento.

5. Por que razão se pode dizer que a crença religiosa tem racionalidade prudencial?
Quanto à racionalidade prudencial da crença religiosa, pode defender-se que em algumas circunstâncias e para determinadas pessoas é prudencialmente permissível acreditar em Deus. Algumas dessas circunstâncias podem ser as seguintes: situações em que a pessoa ao acreditar em Deus tem mais esperança para enfrentar as adversidades da sua vida, ou para viver com mais otimismo, ou para ser benéfico para a comunidade, etc. Claro que só isso não tem qualquer valor epistémico, mas se tiver benefícios práticos para a pessoa em questão e para os outros, então pode ser nessas circunstâncias e para tais pessoas prudencialmente racional acreditar em Deus.

Respostas – Ficha de Trabalho – Parte II

6. Por que razão se pode dizer que a crença religiosa tem racionalidade epistémica?
Uma teoria simples sobre a racionalidade epistémica é conhecida como “evidencialismo epistémico”. De acordo com essa teoria, uma crença é epistemicamente racional para um sujeito na medida em que a crença do sujeito se ajusta à sua evidência e o sujeito não tem contra-evidência, ou seja, não tem razões para desconfiar dessa essa crença, sendo que tal “evidência” é algo interno ao sujeito (tal como ter experiências, sensações, impressões, etc.). Por exemplo, suponha-se que tenho a experiência, parecer ou impressão de que vejo agora um microfone à minha frente e não tenho qualquer razão para desconfiar disso. De acordo com o evidencialismo, esta minha crença é epistemicamente racional (dado que se conforma à minha evidência e não possuo qualquer razão para desconfiar dessa crença). Com base nessa teoria é possível defender que a crença religiosa tem racionalidade. Isto porque há pessoas com fé que têm experiências, impressões, pareceres de que estão em comunhão com Deus, que se sentem amadas por Deus, perdoadas, escutadas, etc. Além disso, muitas dessas pessoas não têm razões para desconfiar da crença em Deus. Por isso, dado o evidencialismo epistémico, para tais pessoas a crença em Deus é epistemicamente racional (mesmo se não acreditam com base em argumentos).

7. Que críticas se pode apresentar à racionalidade prudencial e epistémica da crença em Deus?
Como crítica à racionalidade prudencial e epistémica da crença em Deus pode-se argumentar que nem todas as pessoas tem esse tipo de experiência e que essas experiências religiosas podem ser ilusórias ou enganadoras. Por exemplo, há pessoas que também têm experiências, impressões, pareceres sobre crenças no xamanismo, na bruxaria, no vodu, na astrologia, etc. Ora, de acordo com a teoria do “evidencialismo epistémico”, perante isso e se tais pessoas não possuírem qualquer contra-evidência ou razões para desconfiar disso, tais crenças são racionais na ausência de argumentos. Todavia, essa consequência pode parecer contra-intuitiva dado que tais crenças são muito esquisitas e bizarras.

8. Qual é o argumento principal para se colocar Deus em causa? Explique brevemente esse argumento?
O argumento principal para se colocar Deus em causa é o argumento do mal. Uma das versões atuais mais relevantes é a versão probabilística. Muito sinteticamente o argumento é o seguinte: Primeiro parte-se da ideia de que pelo menos algum dos males no nosso mundo parece gratuito (aparentemente não servindo qualquer propósito benéfico). Daí se infere que provavelmente algum dos males no nosso mundo é gratuito e não serve qualquer propósito benéfico. Todavia, se Deus existe, então não há males gratuitos. Pois, se Deus é moralmente perfeito e poderoso, então poderia evitar tais males aparentemente gratuitos e sem sentido, que não parecem ter qualquer justificação. Tendo em conta isto, pode-se concluir que provavelmente Deus não existe.

9. De que forma se pode criticar esse argumento contra a existência de Deus?
Pode-se criticar o argumento do mal com a resposta do “teísmo cético”. Com essa resposta procura-se mostrar que a inferência de “parece-nos haver” mal gratuito para “provavelmente há” mal gratuito não é procedente dadas as nossas limitações cognitivas. Por exemplo, não podemos usar a nossa incapacidade para ver quaisquer insetos numa garagem (quando estamos a olhar da rua) para concluir que é improvável que haja insetos nessa garagem. De forma similar, não podemos usar a nossa incapacidade para apreciar as razões que justifiquem a Deus permitir um mal para concluir que é improvável que haja qualquer razão que justifique a Deus permitir esse mal.

10. De que forma o desacordo religioso coloca em causa a crença religiosa?
Pode-se argumentar que desacordo religioso pode colocar em causa a racionalidade da crença religiosa a partir da seguinte analogia: vamos jantar com amigos e no fim queremos determinar o que cada um deve pagar. Nós os dois somos bons a fazer cálculo mental e não temos razões para desconfiar. Todavia, a mim o resultado dá-me 23€ e a si dá-lhe 25€. Ora, neste caso é epistemicamente irracional para mim preferir a minha crença (mesmo se correta), pois eu não pareço ter uma boa razão para preferir a minha própria crença em vez da sua. Algo similar pode ocorrer com respeito à crença em Deus, tendo em conta o grande desacordo que as pessoas igualmente inteligentes têm em relação à crença religiosa.

Material enviado por Diogo Faria.
Muito Obrigado!




                                                Lola

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