O Cepticismo
«Há vários graus de ceticismo. Um cético pode ser simplesmente alguém que nega a possibilidade de conhecimento genuíno (em algumas ou em todas as áreas de investigação). Um cético deste tipo não precisa de criticar a posse de crenças sobre vários assuntos, se a pessoa que as possui não alegar que essas crenças têm o estatuto de conhecimento. Ele próprio pode muito bem ter crenças, incluindo a crença de que não há conhecimento. Não há aqui qualquer inconsistência desde que ele não alegue saber que não há conhecimento. Arcesilau chegou ao ponto de criticar Sócrates por este ter afirmado saber que nada sabia.
“Existe uma espécie de ceticismo, anterior a qualquer estudo ou filosofia, muito recomendado por Descartes e outros como sendo a soberana salvaguarda contra os erros e os juízos precipitados. Este cepticismo recomenda uma dúvida universal, não apenas quanto aos nossos princípios e opiniões anteriores, mas também quanto às nossas próprias faculdades, de cuja veracidade, diz ele, devemos nos assegurar por meio de uma cadeia argumentativa deduzida de algum princípio original que seja totalmente impossível tornar-se enganador ou falacioso. Mas nem existe qualquer princípio original como esse, dotado de qualquer prerrogativa sobre outros que são evidentes e convincentes; nem, se existisse, poderíamos avançar um passo além dele, a não ser pelo uso daquelas mesmas faculdades das quais se supõe que já suspeitamos. A dúvida cartesiana, portanto, se jamais fosse capaz de ser alcançada por qualquer criatura humana (o que claramente não é), seria totalmente incurável, e nenhum raciocínio poderia alguma vez nos levar a um estado de segurança e convicção acerca de qualquer assunto.
Deve-se todavia confessar que o ceticismo, quando é mais moderado, pode ser entendido num sentido muito razoável, e constitui uma preparação para o estudo da filosofia, preservando uma adequada imparcialidade nos nossos juízos e libertando-nos o espírito de todos os preconceitos de que possamos ter sido impregnados pela educação ou por opiniões precipitadas.”
David Hume, Tratados I: Investigação sobre o Entendimento Humano,
tradução de João Paulo Monteiro, Lisboa, INCM, 2002, pp. 161-162.
O
CEPTICISMO
Para Platão, eram
necessárias três condições para haver conhecimento: Crença, verdade e
justificação. Há, no entanto, dificuldades em saber que tipo de razões permitem
justificar, adequadamente, as nossas crenças.
· Há diferentes
perspectivas sobre a natureza da justificação: serão os sentidos uma
fonte fiável de justificação? Será a razão suficiente para
justificar as nossa crenças?
· Os empiristas defendem
o papel da experiência na justificação das crenças; os racionalistas salientam
o papel da razão como meio de justificação das crenças.
· Há, no entanto,
quem defenda que nenhuma fonte de justificação é satisfatória – seja ela a
razão (a priori), seja ela a experiência (a posteriori.
· Os cépticos defendem que não é possível o
conhecimento – o cepticismo é
uma corrente da filosofia grega iniciada pelo filósofo Pirro de Élis (365 – 275
A. C.) e continuada por outros filósofos, nomeadamente Sexto Empírico
(160-210).
· Os cépticos
defendem que nenhuma das nossas crenças está devidamente justificada, quer seja
pelo pensamento, quer seja pela experiência.
· Para os cépticos
a justificação baseada nos sentidos ou na razão não nos garante de que não
estamos enganados – assim, à falta de uma justificação adequada, nenhuma das nossas crenças poderá ser considerada conhecimento.
· Os cépticos
aceitam o seguinte:
- Todos nós temos
crenças
- Sem crenças não há
conhecimento
- Algumas das nossas
crenças são verdadeiras
- Sem crença justificada
não há conhecimento.
· Os cépticos
defendem que não há crenças justificadas, mesmo que algumas dessas crenças
sejam verdadeiras, não é possível existir conhecimento.
· O argumento
central dos cépticos é o seguinte:
- Se há conhecimento,
algumas das nossas crenças estão justificadas
- Mas, nenhuma das
nossas crenças está justificada
- Logo, não há
conhecimento.
· Formalizando o argumento:
S P
Não P
Logo, não S
Razões que levam os cépticos a duvidar:
1. Argumento
da divergência de opiniões: se alguma opinião estivesse devidamente
justificada, não haveria razão para que as outras pessoas não a aceitassem.
Ora, isto não acontece mesmo em especialistas da mesma área.
- Se houver duas
opiniões opostas acerca do mesmo tema (Ex: Deus existe e Deus não existe), isso
não significa que ambas sejam falsas, mas mostra que nenhuma delas está
devidamente justificada.
- Nem tudo é uma questão
de opinião, por exemplo, as pessoas estão de acordo acerca da cor da neve ou da
composição química da água e, sabemos que há noções universais na Física, na
Química e na Matemática – só são possíveis porque resultam de consensos.
- A divergência de
opiniões é irreversível e definitiva, o que não é verdade, como por exemplo, a
igualdade de direitos no trabalho entre homens e mulheres.
2. Argumento da ilusão dos sentidos: os sentidos enganam-nos, frequentemente, e isso leva-nos a ver que há uma diferença entre aquilo que pensamos conhecer e a realidade - há ilusões perceptivas que nos dão aparências e nos iludem sobre o movimento da terra e a cor da água do mar, por exemplo.
Porém, a ciência, ultrapassando a ilusão dos sentidos, fornece-nos noções universais tais como "A água ferve a 100º", ou "A fórmula química do oxigénio é O2".
3. Argumento da regressão infinita: este argumento diz-nos que a justificação de qualquer crença é inferida de outras crenças. ora para que esta segunda crença possa justificar a primeira, temos de a justificar também recorrendo a uma nova crença anterior.
Como isto não tem fim, acabamos por nunca conseguir justificar crença alguma, pois tudo o que fizemos foi recuar o problema da justificação, iniciando uma regressão que não acaba mais e que, por isso, é infinita.
Poderemos contrariar este argumento? A dúvida tem limites, pois há certezas que se justificam a si próprias e que servem de base a outras verdades, como por exemplo, "A soma dos ângulos internos de um triângulo é de 180º".
- O ceticismo é uma perspectiva filosófica iniciada pelo filósofo grego Pirro de Élis (365-275 A. C.) e continuada por outros filosofos tais como Sexto Empirico (160-210).
Cepticismo e conhecimento | Como se podem justificar, adequadamente, as nossas crenças? Duas perspectivas diferentes: - os racionalistas defendem que a razão tem um papel fundamental na justificação das crenças. - os empiristas pensam que é só a experiência é capaz de justificação das crenças |
E o que defendem os cépticos? - Nenhuma fonte de justificação é satisfatória. - Nenhuma crença está devidamente justificada Logo, para os cépticos. não há conhecimento |
Três argumentos que levam os cépticos a defender que não há conhecimento | 1. Argumento das divergências de opinião Se alguma crença estivesse devidamente justificada não haveria razão para algumas pessoas não as aceitarem. Até os especialistas discordam entre si. |
2. Argumento da ilusão Os sentidos iludem com frequência. | |
3. Argumento da regressão infinita da justificação Justificamos uma crença com base noutra que, por sua vez, se justifica com base noutra crença, numa regressão infinita. Assim, não é possível justificar uma crença. |
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