quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Homem e possibilidades




O homem sujeito de múltiplas possibilidades

Texto

“A deficiência física (o facto de ter nascido sem braços e sem pernas) não constituiu obstáculo para uma vida normal. Aliás, normalidade é o lema pelo qual pauta a sua existência. A diferença caracteriza-o, mas não o define. Eu nunca quis ser olhado como coitadinho, sublinha repudiando esse rótulo.
Aos 27 anos, Paulo Azevedo cumpre o objectivo que sempre o mobilizou: ser actor. Integra o elenco da novela Podia acabar o mundo onde dá corpo ao advogado Raimundo. Está a ser uma experiência muito positiva, diz. As expectativas que depositou não saíram defraudadas. O actor revela ter ainda um projecto no cinema. Fui seleccionado para um filme, mas nada posso adiantar. Admite saudades do teatro e se alguém o aliciar, não descarta a hipótese. Com uma condição: Não se tratar de algo que enfatizasse a minha fragilidade. Recentemente mergulhou nos meandros da literatura escrevendo um livro: Paulo Azevedo – Uma vida normal”.

Jornal de Notícias, 30 de Novembro de 2008


1 – Partindo do texto, confronte determinismo e liberdade enquanto formas de interpretar o agir humano.


2 – Sabendo que toda a acção humana é condicionada, poderá o homem continuar a afirmar que é um ser capaz de livre-arbítrio? Justifique.


1 – Paulo Azevedo é um ser humano extraordinário. Nasceu com um conjunto de limitações físicas mas isso não o impediu de querer ultrapassá-las, já que, como sabemos o homem é o único ser com capacidade de ultrapassar obstáculos criando novas possibilidades no seu agir: apesar de não ter mãos, parte dos braços nem pernas ele rejeita ser apelidado de coitadinho. Enfrenta uma sociedade de preconceitos e recusa viver de subsídios de invalidez ou de esmolas. Perante essa situação poderemos pensar que o Paulo (seguindo o determinismo) ficaria imobilizado no seu aspecto físico e entenderia que a nossa vida está pré-determinada por uma força abstracta (o destino) ou divina (Deus quis assim) mas ele como ser livre que é encontrou outras possibilidades no seu agir e assim, projectou o seu futuro de forma criativa, inventiva, fez novas escolhas, tirou um curso de treinador de futebol, frequentou o curso de jornalismo na Universidade de Coimbra, lutou pela namorada que teve a oposição feroz dos pais, quer fazer teatro, é actor numa novela, escreveu um livro, joga futebol, pratica desportos radicais e natação. Paulo Azevedo é um exemplo de que o homem é um ser inacabado, livre, responsável, aberto ao futuro, capaz de vencer barreiras (condicionantes) que mais que o limitar devem para que, cada vez mais, termos consciência de que somos seres projectivos – um projéctil.
2 – Sim. Só o homem é um ser dotado de livre-arbítrio, ou seja, tem capacidade de se elevar acima das suas determinações biológicas, sociais, culturais e históricas em que vive. Porque é um ser de livre-arbítreo, o homem assume-se como ser inteligente, racional, com projectos, planos, com valores éticos e morais. Livre-arbítrio pode ser entendido como a vontade de um sujeito livre, consciente e responsável capaz de escolher entre o Bem e o Mal. A liberdade, no sentido de livre-arbítrio tem, inevitavelmente, limites. Há realidades que não dependem da nossa vontade. Não podemos sair do sistema solar, não podemos viver duzentos anos nem estar em dois lados ao mesmo tempo. Há determinismos insuperáveis. Mas temos de ter consciência de que o facto de sermos livres não significa que possamos obter algo de forma absoluta. A liberdade consiste em escolher dentro do possível e não se poderá confundir com omnipotência (que significa poder divino).Se há aspectos  que dependem da nossa vontade, há, no entanto, outros que não. O homem que é um ser inacabado, constrói-se a si próprio a partir das características biológicas e das influências culturais. A liberdade humana não é absoluta, é situada, contextualizada e condicionada por factores físicos, biológicos, socioculturais e pessoais. No nosso agir há limites legais, morais e absolutos pois somos seres imperfeitos e finitos.

A quem interessar...



U
Paulo Azevedo nasceu sem mãos e sem pernas em Outubro de 1981. 
Nessa altura ainda não havia ecografias em Portugal e, por isso, a família soube das características do bebé apenas depois do nascimento. A dúvida sobre o que poderá ter causado a malformação persiste até hoje.



Depois do choque inicial, a família mais próxima iniciou com Paulo um longo e díficil 
caminho para uma vida normal. 

 Durante longos meses percorreram centenas de quilómetros 
entre a Redinha, em Pombal, e o centro de reabilitação de Alcoitão, em Sintra.

Contrariaram os presságios mais negros que diziam que a criança nunca conseguiria sequer
 sentar-se, muito menos andar com próteses.

O rapazinho com quem a mãe ralhava por esconder os braços debaixo da mesa cresceu depressa.
Aprendeu que a ironia é a melhor forma de combater o desconforto perante a diferença.

Paulo Azevedo tem hoje 26 anos e é uma pessoa absolutamente autónoma. 
Já foi treinador de futebol, mas agora sonha com outros palcos.

Lola



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