domingo, 29 de junho de 2014

Ciência e Deus

Detector do acelerador de partículas LHC na fronteira franco-suíça CERN

O bosão de Higgs, que não tem nada a ver com Deus, é uma partícula muito importante

A procura – durante quase 50 anos, até ser detectada em 2012 – da partícula que confere massa às outras partículas é contada no que foi considerado o melhor livro de divulgação de ciência pela Royal Society de Londres em 2013. Escrito por um físico do Instituto de Tecnologia da Califórnia, nos EUA, esta é a pré-publicação de um excerto do livro que, a partir desta quarta-feira, começa a chegar às livrarias portuguesas.

·   Novos resultados reforçam a ideia de que o bosão de Higgs se comporta como previsto pela teoria em vigor
·     Dois cientistas britânicos descobridores do bosão de Higgs armados cavaleiros
·     Maior acelerador de partículas do mundo confirma existência de “hadrões exóticos”



Actualmente, Leon Lederman tem as suas dúvidas. Sabe o que fez, mas não pode voltar atrás. É uma daquelas pequenas coisas que tem grandes e inesperadas consequências.
Estamos a falar, obviamente, da “partícula de Deus”. Não da partícula em si, que não é mais do que o bosão de Higgs. Mas do “nome” “partícula de Deus”, pelo qual Lederman é responsável.
Lederman, um dos grandes físicos experimentais do mundo, ganhou o Prémio Nobel da Física em 1988, por descobrir que existe mais de um tipo de neutrinos. Se não o ganhasse por causa disso, havia outras conquistas suas dignas do prémio, incluindo a descoberta de um novo género de quark. Existem apenas três neutrinos e seis quarks conhecidos e, portanto, estas descobertas não nascem exactamente das árvores. No seu tempo livre, foi director do Fermilab e fundou a Academia de Matemática e Ciência de Illinois. Lederman também é uma pessoa carismática, famosa entre os colegas pelo seu humor e pela sua capacidade de contar histórias. Uma das suas histórias favoritas refere-se ao tempo quando, estudante de doutoramento, arranjou maneira de interpelar Albert Einstein enquanto ele caminhava nos jardins do Instituto de Estudos Avançados de Princeton. O grande homem ouviu pacientemente enquanto o ansioso jovem explicava a investigação em física de partículas que andava a fazer em Columbia, e depois disse com um sorriso: “Isso não é interessante.”
Mas, para o público em geral, Lederman é mais conhecido por algo menos feliz: a criação da expressão “partícula de Deus” para se referir ao bosão de Higgs. De facto, é o título de um livro cativante sobre física de partículas e a busca do bosão de Higgs que escreveu em conjunto com Dick Teresi. Como explicam logo no primeiro capítulo do livro, os autores escolheram a expressão em parte porque “o editor não nos deixou chamar-lhe a Partícula Maldita[Goddamn Particle, no original], apesar de poder ser um título mais apropriado, dada a sua natureza vil e os gastos que implica.






Os físicos de todo o mundo, um bando notoriamente rebelde, concordam alegremente numa coisa: odeiam o nome “partícula de Deus”. Peter Higgs, de quem provém o nome mais tradicional, diz com uma gargalhada: “Fiquei realmente irritado com aquele livro. E penso que não fui o único.”
Entretanto, os jornalistas de todo o mundo, que também podem ser bastante contenciosos, encontram unanimidade num único ponto: adoram o nome “partícula de Deus”.
Uma das apostas mais seguras no mundo é que, se encontrar um artigo na imprensa popular sobre o bosão de Higgs, o artigo vai chamar-lhe a certa altura “partícula de Deus”.
É difícil culpar os jornalistas. Se pensarmos bem, “partícula de Deus” é um grande achado, enquanto “bosão de Higgs” é um pouco incompreensível. Mas também não podemos culpar os físicos. O Higgs não tem nada a ver com Deus. É apenas uma partícula muito importante, uma partícula com a qual vale a pena ficar entusiasmado, ainda que esse entusiasmo não esteja ao mesmo nível que o êxtase religioso. Vale a pena compreender por que razão os físicos se sentem tentados a conceder um estatuto divino a esta humilde partícula, ainda que ela esteja na realidade livre de qualquer implicação teológica. (Alguém pensará mesmo que Deus tem partículas favoritas?)







A mente de Deus


Os físicos têm uma relação longa e complicada com Deus. Não apenas com o hipotético ser omnipotente que criou o Universo, mas com a própria palavra “Deus”.
Quando falam do Universo, tendem a usar a ideia de “Deus” para expressar coisas sobre o mundo físico. Einstein era famoso por isto. Entre as citações mais vezes repetidas deste cientista eminentemente citável estão: “Só quero conhecer os pensamentos de Deus, o resto são pormenores” e, claro, “estou convencido de que Deus não joga aos dados com o Universo”.
Muitos de nós têm caído na tentação de seguir as pegadas de Einstein. Em 1992, um satélite da NASA chamado Cobe (Cosmic Background Explorer — Satélite de Exploração do Fundo Cósmico) deu-nos imagens fantásticas de pequenas ondulações na radiação de fundo deixada pelo Big Bang. A importância do acontecimento levou George Smoot, um dos investigadores do Cobe, a dizer: “Se forem religiosos, é como ver Deus.” (…)

In Publico de 29 fr Junho de 2014
 SEAN CARROLL 
25/06/2014 - 08:06





Cientista norte amaricano, Prémio Nobel da Fisica 1988

Lola

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