Os valores
Podemos classificar os valores de um duplo ponto de
vista: formal e material.
Do ponto de vista formal, os valores
dividem-se em:
1 - Positivos e
negativos. Valor positivo é aquele que mais geralmente costumamos
designar pela expressão pura e simples de “valor”. O conceito de “valor”
é geralmente usado numa dupla acepção: umas vezes, entende-se por esta
palavra o valor em geral, independentemente da polaridade
valor-desvalor, como conceito neutro, outras vezes entende-se só o seu
aspecto positivo contraposto ao negativo. Ao valor positivo contrapõe-se
o negativo, chamando-se então a este mais propriamente “desvalor”. Esta
polaridade pertence à própria estrutura essencial da ordem axiológica,
que assim se distingue fundamentalmente da ordem do ser a que é estranha
uma tal estrutura.
2 - Valores das pessoas e
valores das coisas, ou valores pessoais e reais. Valores das pessoas ou
pessoais são aqueles que só podem pertencer a pessoas, como os valores
éticos. Reais (de res) os que aderem a objectos ou coisas impessoais,
como os das coisas ditas valiosas, designadas mais geralmente pela
expressão “bens”.
3 - Valores em si mesmo, ou
autónomos e valores derivados de outros ou dependentes. O valor em si
reside na sua mesma essência; possui esse carácter com independência de
todos os outros valores; não depende deles; não é meio para eles.
Como todos os valores se acham referidos a um sujeito – o sujeito humano, o homem - e este é, antes de mais nada, um ser constituído por sensibilidade e espírito, daí o poderem classificar-se imediatamente todos os valores nas duas classes fundamentais de: valores sensíveis e valores espirituais. Os primeiros referem-se ao homem enquanto simples ser da natureza, os segundos ao homem como ser espiritual.
Como todos os valores se acham referidos a um sujeito – o sujeito humano, o homem - e este é, antes de mais nada, um ser constituído por sensibilidade e espírito, daí o poderem classificar-se imediatamente todos os valores nas duas classes fundamentais de: valores sensíveis e valores espirituais. Os primeiros referem-se ao homem enquanto simples ser da natureza, os segundos ao homem como ser espiritual.
A – Valores sensíveis.
A esta categoria pertencem:
1
– Os valores do agradável e do prazer, também chamados “hedónicos”. Ela
abrange não só todas as sensações de prazer e satisfação, como tudo
aquilo que é apto a provocá-las (vestuário, comida, bebidas, etc.). À
ética que apenas conhece estes valores chama-se geralmente hedonismo.
2
- Valores vitais ou da vida. São aqueles valores de que é portadora a
vida, no sentido naturalista desta palavra, isto é, Bios. Cabem aqui o
vigor vital, a força, a saúde, etc. Como se sabe, foram estes os valores
que Nietzsche reputou os mais elevados de todos na sua escala
axiológica, como os únicos mesmo. E ao que se chama biologismo ético ou
naturalismo.
3 - Valores de utilidade.
Coincidem com os chamados valores económicos. Referem-se a tudo aquilo
que serve para a satisfação das nossas necessidades da vida (comida,
vestuário, habitação, etc.) e ainda aos instrumentos que servem para a
criação destes bens. Distinguem-se dos restantes valores desta classe,
nomeadamente dos sensíveis, para os quais aliás concorrem, por não
serem, do ponto de vista formal, autónomos, mas derivados, no sentido
que acima vimos.
B – Valores espirituais.
Estes distinguem-se dos valores sensíveis, no seu conjunto, não só pela imaterialidade que acompanha a sua perdurabilidade, como pela sua absoluta e incondicional validade. Muitos filósofos, que encaram os valores só por este último lado, identificando-os por isso com o conceito de simples “valor” ou validade formal, pretendem que só os valores espirituais são verdadeiros valores.Porém, quem se lembraria de negar aos economistas o direito de usarem também do termo e do conceito de valor? À categoria dos valores espirituais pertencem:
1- Os valores lógicos. Quando se fala de valores lógicos, é preciso ter presente que se podem entender por esta expressão duas coisas distintas: a função do conhecimento – o saber, a posse da verdade e o esforço para a alcançar - e o conteúdo do conhecimento. No primeiro sentido, é óbvio que podemos falar, com todo o direito, em valores lógicos ou no valor do conhecimento. Contrapor-se-lhe-ão, como desvalor lógico, a ignorância, o erro, a falta de interesse pela verdade, a ausência de esforço para a alcançar, etc. Mas a expressão “valor lógico” pode significar também o próprio conteúdo do conhecimento. E, neste segundo caso, é “valor lógico” tudo aquilo que cai dentro do par de conceitos verdadeiro-falso [...].
2 - Valores éticos: ou do bem moral. Destes podem dar-se as seguintes características:
a) Só podem ser seus portadores as pessoas, nunca as coisas. Só seres espirituais podem encarnar valores morais. Por isso o âmbito destes valores é relativamente restrito; muito mais, por exemplo, que o dos estéticos.
b) Os valores éticos aderem sempre a suportes reais. Também, por este lado, se distinguem dos valores estéticos, cujo suporte é constituído por algo de irreal, de mera aparência.
c) Os valores éticos têm o carácter de exigências e imperativos absolutos. Dele desprende-se sempre um categórico “tu deves fazer” ou “tu não deves fazer”, isto ou aquilo; exigem, imperiosamente, que a consciência os atenda e os realize. E nisto se separam também dos estéticos que não impõem nenhuma exigência desta natureza, nem se nos impõem incondicionalmente.
d) Os valores
éticos dirigem-se ao homem em geral, a todos os homens; são universais, a
sua pretensão a serem realizados é universal. Os estéticos não estão
neste caso, apenas dirigem o seu apelo a alguns homens, para que estes
os realizem, e nem todos podem ser obrigados a dar-lhe acolhimento, a
fazer arte, ou a cultivá-las de qualquer maneira.
e) Além disso, é, pode
dizer-se, ilimitada também a exigência que os valores éticos nos fazem:
constituem uma norma ou critério de conduta que afecta todas as esferas
da nossa actividade e da nossa conduta da vida. Esta acha-se sujeita,
total e incondicionalmente, a eles na sua imperiosa jurisdição e
validade. Nada deve ser feito que os contrarie. Poderia definir-se esta
característica dos valores éticos chamando-lhes totalitários. Não assim
os valores estéticos. Estes só reclamam de nós que os realizemos em
certas situações e momentos da vida, permanecendo calados durante os
restantes; não somos obrigados a ser estetas e, menos ainda, a toda a
hora (…).
3 - Valores estéticos, ou do Belo. Incluímos aqui no conceito de belo, no mais amplo sentido desta palavra, o sublime, o trágico, o amorável, bonito outros.
4 - “Valores religiosos ou do”sagrado”. Já atrás aludimos ao que há de original nestes valores. A eles não adere propriamente nenhum “deve ser”. Não temos que realizar esses valores; nem isso é possível nem necessário. Não são valores de um “deve ser”, mas valores de um “ser”; Nisto se afastam dos valores éticos para se aproximarem dos estéticos com os quais estão numa relação muito íntima. Todavia, existe também entre eles e estes últimos uma diferença que cumpre salientar: a realidade do “sagrado”, não é, como a do “Belo”, apenas uma realidade aparente, mas uma realidade no mais eminente sentido desta palavra.
Johannes Hessen, Filosofia dos Valores,
Ed. Arménio Amado; Coimbra. pp. 107-117
Lola
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