Conhecimento e esforço
Filósofo francês Pierre Lévy
defende:
‘Não há conhecimento sem esforço’
Título original: “Filósofo francês que estará em evento do EXTRA, Pierre
Lévy defende: ‘Não há conhecimento sem esforço”
Um professor com
jeitão de guia e um aluno mais responsável pela sua formação. Esse é o futuro
projetado pelo filósofo francês Pierre Lévy, que estará no encontro
internacional Educação 360, promovido pelo EXTRA e pelo “Globo” nos dias 5 e 6
de setembro. “Devemos treinar o estudante para se engajar na construção do
conhecimento colaborativo. Pode não ser útil para ser aprovado numa prova, mas
será útil para ele no trabalho, como cidadão”, aconselha o professor da
Universidade de Ottawa, no Canadá, que é autor de livros como “Cibercultura”
(1997) e “A esfera semântica” (2011). Nesta entrevista ao EXTRA, Lévy fala dos
desafios trazidos pelas novas mídias e mostra alguns caminhos para a nova sala
de aula.
Qual o novo papel do professor com as novas mídias em rede?
O professor deve
participar mais ativamente dessa nova mídia. Entendê-la e usá-la
sistematicamente para o seu próprio aprendizado. Ler a Wikipédia não é o mesmo
que ler no papel. Na nova mídia, você não aprende lendo o texto. Aprende junto:
se comunicando, com exploração ativa, comparando fontes… Se os professores não
usarem essa nova mídia para si mesmos, nunca serão capazes de ensinar os alunos
a usar essas ferramentas. Os estudantes já sabem usar as redes sociais para
trocar vídeos de gatinhos, para diversão ou videogames estúpidos. Agora, têm
que aprender a escolher jogos interessantes e sérios. Entender o processo de
aprendizado coletivo e filtragem de dados.
Quais os métodos para essa tarefa de guia do professor?
Há muitas situações
diferentes. Não só geográficas e culturais, mas também entre os níveis
educacionais. Você não usa a internet ou o tablet do mesmo jeito na educação primária
e na universidade. Não há métodos universais que se encaixem em qualquer
situação. Por isso, encorajo os professores a aprenderem por eles mesmos e
adaptarem os tipos de exercícios aos estudantes.
Como o senhor faz com seus alunos?
Abro um grupo no Facebook
e os convido para fazerem uma seleção de conteúdo. Eles têm que publicar algum
conteúdo, que seja relevante e conectado com o assunto da aula, com um pequeno
comentário. Também crio subgrupos no Facebook para os alunos discutirem
questões particulares e ajudarem uns aos outros. Peço para me seguirem no
Twitter e me indicarem materiais importantes relacionados com pontos que vimos
em sala de aula. Além disso, os convido a entrar no Schoolpix, que é uma
ferramenta de conteúdo. Há várias na internet, essa é só um exemplo. Esse
conjunto de ações é um dos melhores jeitos de o aluno explorar os múltiplos
recursos de fontes e botar em prática alguma responsabilidade em escolher as
informações e as fontes certas e o jeito de organizá-las. É importante escolher
e categorizar as informações. Não ser apenas um consumidor de informações.
O que o senhor acha da divisão da escola por disciplinas?
É importante para o
professor ter um sólido conhecimento no tema que está ensinando. É mais
interessante a gente pensar em assuntos do que disciplinas. Ou seja, se for
falar sobre o Brasil, pode falar sobre a geografia, a história, a economia e
outras coisas. Então, o professor deve ter uma perspectiva multidisciplinar,
mas só sobre disciplinas.
Alunos que estão no nível da alfabetização devem usar equipamentos
tecnológicos?
Assim que eles
aprendem a ler e a escrever, eles podem usar uma mídia interativa como o
tablet. Devem começar desde cedo. Existem perigos. Algumas imagens não são boas
para as crianças. E algumas coisas são muito violentas. É uma questão de bom
senso no uso da tecnologia.
O uso de tecnologia na sala de aula é o caminho natural do aprendizado?
Não existe um caminho
natural. A educação está sempre se desenvolvendo. É uma questão de adaptação
cultural e também de iniciativas. Sou a favor da adoção dessas tecnologias,
como os tablets, mas isso não resolve os problemas. Se os professores não
forem, eles mesmos, muito bons em usar essas ferramentas, no sentido de usar
para aprender, para explorar, colaborar e tudo mais, não vai ser válido. Só
tablets não fazem o trabalho sozinhos. Só a ferramenta não resolve, se você não
sabe usar. O ponto importante, não só para os professores, mas também para os
alunos, é usar para aprender de forma colaborativa e para explorar. Não ficar
sempre na mesma rede social ou nos mesmos lugares, mas explorar diferentes
ferramentas, funções, comunicações.
No Brasil, há escolas que não têm nem bibliotecas. A inclusão da tecnologia
aumenta a diferenças entre escolas públicas e privadas?
Já estive no país e
ouvi muito que essa diferença aumentaria. Mas acho que é só uma maneira de
evitar olhar para os fatos e se adaptar. A gente devia encorajar a nova mídia
de todas as formas possíveis e usar isso para combinar o aprendizado individual
com o aprendizado coletivo. Compartilhar a nossa exploração. A construção de
uma memória pessoal online e de uma memória coletiva online. Devemos treinar o
aluno para ele saber lidar com o próprio aprendizado e se engajar na construção
do conhecimento colaborativo. Não vai ser útil para ser aprovado em algum
exame, mas vai ser útil para ele no trabalho, para ele como cidadão.
Qual é a nova posição do aluno no aprendizado?
Pensamento crítico
sempre foi uma parte importante da educação, mas agora é ainda mais. Os
estudantes devem perceber que conhecimento não existe independentemente das
pessoas. É algo que se produz por pesquisadores, professores, jornalistas e
outras pessoas. E que eles também podem fazer. Devem entender o mais cedo
possível que, mesmo em ciências, e, especialmente em ciências humanas, existem
diferentes teorias. E não há apenas uma verdadeira e outras erradas. Eles devem
se acostumar ao fato de que produção de conhecimento é algo muito diversificado
e colaborativo, mas também competitivo entre diferentes ideias e teorias. E que
eles devem se tornar responsáveis. Na nossa relação com o conhecimento, somos
responsáveis pelo conhecimento que criamos, aprendemos e transmitimos.
O ensino à distância é menos confiável?
Existe uma diferença
muito pequena entre estudo à distância e presencial. Mesmo no modelo
tradicional, em classe, peço para meus alunos fazerem muitos trabalhos em casa,
e muito da nossa comunicação acontece no espaço digital: Facebook, Twitter ou
outras plataformas. Acho importante ter o encontro presencial entre aluno e
professor, mas a qualidade é independente disso. Você pode ter alta ou baixa
qualidade à distancia, só tem que ver o resultado. Se os alunos deixaram o
curso e não passaram, é má qualidade. Se for ao contrário, a qualidade é boa. É
claro que há muito curso ruim. Se ninguém fica até o fim, não deu certo.
A inclusão da tecnologia na educação aumenta a demanda do poder público?
Na verdade, é o
contrário. Você pode colocar todos os livros dentro de um tablet. Fica mais
barato até.
Qual o cenário mais otimista da contribuição das novas mídias para a
educação?
Uma vez que você seja
alfabetizado, tem a possibilidade de acesso a todo conhecimento do mundo de
graça e a possibilidade de se comunicar com o mundo todo. É claro que isso não
vai acontecer sem trabalho. Não há conhecimento sem esforço. Mas, uma vez que
você queira aprender, você pode. Melhor e mais rápido do que de outras
maneiras.
http://www.livrosepessoas.com/2014/08/03/filosofo-frances-pierre-levy-defende-nao-ha-conhecimento-sem-esforco/
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