estamos
todos no mesmo barco?
O surto de covid-19 e as medidas de
distanciamento social apanharam as pessoas de surpresa e provocaram alterações
de rotina profundas. Dada a natureza imprevisível do vírus, muitos dizem que
estamos na presença de um “choque simétrico”, isto é, algo que afeta todos por
igual (países e pessoas) e em que todos sofremos as consequências. É isso que
se tem verificado?
Recentemente, tem-se dado mais atenção ao impacto desigual do vírus nas sociedades. A desigualdade começa por se notar entre os países: enquanto as economias mais avançadas dispõem de mecanismos de mitigação dos impactos económicos – por exemplo, a atuação dos bancos centrais na injeção de liquidez nos mercados que permita conter o pânico dos investidores e facilitar as condições de financiamento dos Estados (evitando que os juros da dívida pública disparem) – os países em desenvolvimento não têm a mesma sorte. O peso da dívida, a queda dos preços das mercadorias que estes países exportam (não eram tão baixos desde 1970) e a fuga de capitais que já está a ocorrer levam a que enfrentem o que em economia se chama uma "travagem repentina" (sudden stop), que dificulta o combate à pandemia.
É o caso de África: à medida que o coronavírus se começa a propagar no continente, a crise económica que se seguirá começa a desenhar-se. A quebra no preço e na procura de matérias primas exportadas por estes países pode levar a perdas de 100 mil milhões de dólares, de acordo com a Comissão Económica das Nações Unidas para África. Ao El País, o comissário do Comércio da União Africana, Albert Muchanga, disse que “todos os países [africanos] enfrentam o risco de escassez de bens, aumento do desemprego e subida generalizada dos preços.” Achim Steiner, diretor do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), admite que a pandemia “pode ter consequências catastróficas”. Num continente onde a pobreza e a ausência de condições para o isolamento em várias zonas tornam o combate ao vírus especialmente difícil, a ausência de recursos dos sistemas de saúde e segurança social agrava o problema – Steiner defende que “esta não é apenas uma crise de saúde, mas também uma crise humanitária e de desenvolvimento”.
Recentemente, tem-se dado mais atenção ao impacto desigual do vírus nas sociedades. A desigualdade começa por se notar entre os países: enquanto as economias mais avançadas dispõem de mecanismos de mitigação dos impactos económicos – por exemplo, a atuação dos bancos centrais na injeção de liquidez nos mercados que permita conter o pânico dos investidores e facilitar as condições de financiamento dos Estados (evitando que os juros da dívida pública disparem) – os países em desenvolvimento não têm a mesma sorte. O peso da dívida, a queda dos preços das mercadorias que estes países exportam (não eram tão baixos desde 1970) e a fuga de capitais que já está a ocorrer levam a que enfrentem o que em economia se chama uma "travagem repentina" (sudden stop), que dificulta o combate à pandemia.
É o caso de África: à medida que o coronavírus se começa a propagar no continente, a crise económica que se seguirá começa a desenhar-se. A quebra no preço e na procura de matérias primas exportadas por estes países pode levar a perdas de 100 mil milhões de dólares, de acordo com a Comissão Económica das Nações Unidas para África. Ao El País, o comissário do Comércio da União Africana, Albert Muchanga, disse que “todos os países [africanos] enfrentam o risco de escassez de bens, aumento do desemprego e subida generalizada dos preços.” Achim Steiner, diretor do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), admite que a pandemia “pode ter consequências catastróficas”. Num continente onde a pobreza e a ausência de condições para o isolamento em várias zonas tornam o combate ao vírus especialmente difícil, a ausência de recursos dos sistemas de saúde e segurança social agrava o problema – Steiner defende que “esta não é apenas uma crise de saúde, mas também uma crise humanitária e de desenvolvimento”.
Em Joanesburgo, a maior
cidade da África do Sul, estima-se que haja entre 180 mil e 750 mil pessoas a
viver em cerca de 20 mil barracas. Nas favelas, a falta de condições de
isolamento e higiene, onde muitas vezes não há acesso a eletricidade ou água
corrente, o risco de contágio de doenças é bastante superior. Também na Índia,
as medidas de isolamento social estão a provocar graves problemas sociais – 4
em cada 5 trabalhadores estão na economia informal, grande parte destes sem
garantia de rendimento se não puderem trabalhar. A quarentena e o encerramento
dos transportes levou a que milhares de pessoas tentassem regressar às suas
regiões, tendo o governo reprimido os trabalhadores. E em países como o Brasil,
o México ou a Nigéria, o elevado número de pessoas que vive em favelas complica
o isolamento e leva a que se prevejam tempos difíceis no combate à pandemia.
Os estudos sobre a relação entre a desigualdade e a pandemia também apontam para que esta se manifeste dentro dos países: são as pessoas em estratos económicos mais baixos que têm mais probabilidade de apanhar a doença ou perder o emprego e o rendimento. Nicole Errett, especialista em saúde pública na Universidade de Washington, lembra que “as vulnerabilidades pré-existentes acentuam-se após uma catástrofe como a atual”. Nos EUA, 1 em cada 4 pessoas adiam cuidados de saúde devido aos custos elevados e 45 mil norte-americanos morrem todos os anos devido à falta de um seguro de saúde. Para agravar a situação, depois do aumento sem precedentes do desemprego nas últimas quatro semanas, que levou a que mais de 20 milhões de pessoas tenham perdido o emprego e que afeta desproporcionalmente as mulheres (sobre-representadas nos despedimentos), estima-se que 9,2 milhões tenham ficado ainda sem acesso a seguro de saúde devido ao despedimento.
Os estudos sobre a relação entre a desigualdade e a pandemia também apontam para que esta se manifeste dentro dos países: são as pessoas em estratos económicos mais baixos que têm mais probabilidade de apanhar a doença ou perder o emprego e o rendimento. Nicole Errett, especialista em saúde pública na Universidade de Washington, lembra que “as vulnerabilidades pré-existentes acentuam-se após uma catástrofe como a atual”. Nos EUA, 1 em cada 4 pessoas adiam cuidados de saúde devido aos custos elevados e 45 mil norte-americanos morrem todos os anos devido à falta de um seguro de saúde. Para agravar a situação, depois do aumento sem precedentes do desemprego nas últimas quatro semanas, que levou a que mais de 20 milhões de pessoas tenham perdido o emprego e que afeta desproporcionalmente as mulheres (sobre-representadas nos despedimentos), estima-se que 9,2 milhões tenham ficado ainda sem acesso a seguro de saúde devido ao despedimento.
Outro problema é o
facto de haver maior peso de trabalhadores independentes ou precários nos
setores mais afetados pela pandemia, já que o rendimento destas pessoas pode
não ser garantido numa situação como a que atravessamos. Jeremias Adams-Prassl,
professor de direito na Universidade de Oxford, lembra que os trabalhadores “na economia da partilha,
por exemplo, caracterizada por emprego de curto prazo e mal pago” que estejam
doentes “provavelmente continuarão a trabalhar, pela forma como os incentivos
estão construídos”. A precariedade, a vaga de desregulação laboral e a
flexibilização dos contratos deixam as pessoas mais expostas aos riscos.
O New York Times
também dá conta de que o distanciamento social é um “privilégio”
das classes mais altas, que têm mais facilidade em trabalhar a partir de casa.
A investigação do jornal concluiu que as pessoas com menores rendimentos
continuam a deslocar-se com mais frequência do que os restantes. O trabalho
costuma ser o motivo que as força a manter as saídas de casa, apesar do surto
de coronavírus – é o caso dos profissionais de saúde e de segurança pública,
mas também dos cuidadores, dos estafetas de entregas, funcionários de
restaurantes e mercearias ou canalizadores, para dar alguns exemplos. “As
pessoas mais ricas, dos 10% do topo da distribuição de rendimento, limitaram a
sua movimentação mais rápido do que os 10% da base, nas mesmas áreas
metropolitanas”, lê-se na notícia (gráfico ao lado).
É por isso que, em alguns Estados norte-americanos, a comunidade afro-americana tem sido bastante mais afetada pelo surto: pertencem à classe trabalhadora que não pode fazer teletrabalho, têm maior propensão a desenvolver doenças devido à incidência da pobreza, são discriminados no acesso a testes de covid-19 e vivem em zonas com menos condições. O confinamento seguro, afinal, não é para todos.
Restam poucas dúvidas de que são os países mais vulneráveis que enfrentam maiores dificuldades de isolamento das populações e financiamento das medidas. Também são as pessoas mais vulneráveis, com menores rendimentos, menos estabilidade laboral e menos acesso a cuidados de saúde que sofrem um impacto maior. Não estamos todos no mesmo barco e isso também se vai refletir na profunda recessão que se avizinha.
17 DE ABRIL DE 2020
LADROES DE BICICLETAS
Será que o coronavirus não é, afinal,um virus tão democrático como se apregoa?
Como vencer esta desigualdades, segundo a filosofia de John Rawls?
Lola
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