terça-feira, 20 de janeiro de 2015

Jean-Paul Sartre




Sartre e a recusa do Prémio Nobel

Hoje, na aula do 10° B, os alunos responderam à actividade do manual (p.79) em que um juízo teria de ser identificado como de facto ou de valor!
 Disse-lhes, por curiosidade, que Sartre tinha recusado o Prémio Nobel da Literatura que lhe foi atribuído, pela academia sueca, em 1964.

Alguns alunos acharam estranho a recusa...

Aqui vão as razões de tal atitude!!! 








Como Sartre recusou o Nobel em 14 linhas e pouco mais de 100 palavras

O PÚBLICO teve acesso à carta de 1964 em que o autor de Huis Clos escreveu “não posso nem quero aceitar esta distinção”. O “não” está firmemente sublinhado.

Está datada de 14 de Outubro de 1964 e não do dia seguinte ou de dois dias depois, como até hoje se poderia pensar. De resto, a carta com que o filósofo, romancista e dramaturgo francês Jean-Paul Sarte avisou a Academia Sueca que não tencionava aceitar o Nobel da Literatura, caso este lhe fosse atribuído, não traz novidades. A não ser na escassez de explicações e na veemência da recusa, com o “não” firmemente sublinhado e a referir-se não só àquele ano como a todos os futuros.
“De acordo com certas informações de que tomei hoje conhecimento, eu teria, este ano, algumas hipóteses de conseguir o Prémio Nobel”, lê-se na primeira linha da reprodução da carta que a Academia Sueca fez esta segunda-feira chegar ao PÚBLICO e cujo original Sartre endereçou a Nils Stahle, à época director da Fundação Nobel.
Na declaração pública que uma semana depois faria à imprensa sueca e que o Le Monde publicou numa tradução para francês revista pelo próprio, Sartre diria: “Quando li no Figaro Littéraire de 15 de Outubro […] que a escolha da Academia tendia para mim, mas que ainda não estava determinada, supus que escrevendo uma carta à Academia, que enviei no dia seguinte, poderia esclarecer a questão e que não haveria mais discussão.” Na verdade, a avaliar pela data da documentação agora desembargada pela Academia, depreende-se que Sartre tenha sido avisado dos conteúdos da coluna do correspondente sueco em Paris ou que esta lhe tenha sido dada a ler na véspera da chegada às bancas do suplemento.
Em qualquer dos casos, faltavam ainda oito dias para o anúncio mundial do vencedor, que aconteceria a 22 de Outubro. E o Nobel não divulga listas de candidatos. Donde que Sartre ressalve e esclareça logo de seguida: “Ainda que seja presunçoso dar um voto como decidido antes que ele tenha tido lugar, tomo a liberdade de […] escrever para dissipar ou evitar um mal-entendido.”
De acordo com o que nessa ocasião escreveu, Sartre teria “profunda estima pela Academia Sueca” e pelo prémio com que esta “honrou tantos escritores”. A decisão era, apesar disso, negativa: “Por motivos pessoais e outros, mais objectivos, que não cabe aqui desenvolver, desejo não figurar na lista dos possíveis laureados e não posso nem quero – nem em 1964 nem mais tarde – aceitar esta distinção honorífica.”      
Depois, apenas uma delicada despedida antes da assinatura: “Peço-lhe, senhor Secretário, que aceite as minhas desculpas e que acredite na minha muito alta estima.” Nada mais.
Na verdade, a suposta “estima” de Sartre pela Academia Sueca era matizada. Na sua declaração pública de 22 de Outubro, o “intelectual total” apontou os mesmos “dois tipos de motivos: pessoais e objectivos” que na sua carta. Mas esclareceu-os: “Um escritor que adopta posições políticas, sociais ou literárias deve agir apenas com os meios que são os seus – ou seja, a palavra escrita. Todas as honras que possa receber expõem os seus leitores a uma pressão que não considero desejável.”
Assinar Jean-Paul Sartre “não é o mesmo que assinar Jean-Paul Sartre, vencedor do Nobel”, disse o escritor. Para logo de seguida apontar um exemplo concreto: “As minhas simpatias pelos revolucionários venezuelanos implicam-me apenas a mim, enquanto se Jean-Paul Sartre, o laureado, apoia a resistência venezuelana implica todo o Prémio Nobel como instituição. O escritor deve, assim, recusar deixar-se ser transformado em instituição, ainda que tal ocorra sob as mais honrosas circunstâncias, como é o caso.”
Na mesma declaração, o escritor, que declarara o marxismo como “o horizonte inultrapassável do nosso tempo”, ressalvava não haver na sua atitude qualquer crítica implícita a anteriores vencedores. Já a crítica ao comité, porém, não tardaria na sequência das suas palavras: apontando Neruda, Aragon e Sholokhov, Sartre sublinhou que, sem os premiar, o Nobel se perfilava, à época, “objectivamente”, como “uma distinção reservada aos escritores do Ocidente ou aos rebeldes de leste”.
“A única batalha hoje possível na frente cultural é a batalha pela coexistência pacífica entre duas culturas, a do Leste e a do Ocidente. […] As minhas simpatias vão inegavelmente para o socialismo e aquilo a que se chama Bloco de Leste […] é por isso que não posso aceitar uma honra concedida por autoridades culturais, nem as ocidentais nem as de Leste”, esclareceu Sartre, cujo nome fora proposto ao Nobel pela primeira vez em 1957.  
Em 1957, Jacques Scherer fora uma voz solitária. Desde então, todos os anos o mesmo nome se ouvira em Estocolmo a cada vez mais vozes. Foi a 17 de Setembro de 1964 que o Comité votou, por fim, o autor de A Náusea como vencedor. Encerrado 2014 e terminados os 50 anos de sigilo sobre a documentação ligada à primeira recusa voluntária de sempre do Nobel da Literatura, para além da carta de Sartre, a Academia Sueca fez chegar também ao PÚBLICO a lista dos nomes nesse ano propostos pelos vários membros do júri. Foram 76, entre os quais Miguel Ángel Asturias, W. H. Auden, Samuel Beckett, Jorge Luis Borges, André Breton, Camilo José Cela, Paul Celan, E. M. Forster, Max Frisch, Ionesco, Kawabata, Malraux, Somerset Maugham, Michaux, Mishima, Moravia, Nabokov, Neruda, Perret, C. P. Snow, Sholokhov e Tanizaki.
Entre as sete dezenas e meia de nomes, quatro mulheres: a norte-americana Katherine Anne Porter, a judia alemã Nelly Sachs, a alemã Ina Seidel e a australiana Judith Wright. 

In Publico, VANESSA RATO 
13/01/2015 - 07:15






Chegou tarde a carta de Sartre que poderia ter mudado o Nobel

Meio século depois, a Academia Sueca abriu os arquivos relativos ao Nobel da Literatura de 1964 – aquele que Jean-Paul Sartre venceu e recusou.

Era a oitava vez que o nome de Jean-Paul Sartre estava na mesa. Depois de em 1957 Jacques Scherer ter proposto pela primeira vez o filósofo, romancista e dramaturgo francês como candidato ao Nobel da Literatura, todos os anos o mesmo nome se ouvira em Estocolmo. E cada vez mais alto. Então, a 17 de Setembro de 1964, o Comité decidiu, por fim, que o autor de A Náusea e À Porta Fechada  Huis Clos, no original – seria o vencedor. Assim, chegou tarde a carta que Sartre enviou em meados de Outubro a pedir que não o nomeassem e a avisar que recusaria o prémio caso tal acontecesse, revelam os arquivos agora desembargados pela Academia Sueca, confirmando a narrativa desde sempre associada ao Nobel do “intelectual total”.
Encerrado 2014, terminaram os 50 anos de sigilo previstos pelo regime geral de arquivos. E o diário Svenska Dagbladet, que terá consultado o dossier da que é tida como a primeira verdadeira recusa de sempre do Nobel da Literatura, conta ainda como a decisão de entregar o prémio a Sartre foi contra a vontade do então recém-nomeado secretário permanente, Karl Ragnar Gierow, que sugeriu o russo Mikhail Sholokhov como primeira escolha, e as “reservas” do presidente do comité, Anders Osterling, que considerava o existencialismo sartreano “uma marca registada um tanto duvidosa” e observava com ambivalência a forma como a “personalidade forte e independente” de Sartre se tornara “um poder espiritual na Europa” de então, acreditando, porém, ser a sua influência “reduzida” em anos recentes.
Face a um contexto em que outro dos membros do comité – Eyvind Johnson – se opunha à nomeação, querendo premiar antes o poeta anglo-americano W.H. Auden, talvez se a carta de Sartre tivesse chegado mais cedo a decisão do comité tivesse sido outra, insinua o Svenska Dagbladet, afirmando que haveria, pelo menos, “mais um argumento para não distinguir Sartre”.
O jornal diz que a 22 de Outubro, no momento da votação final que antecedeu o anúncio mundial, Gierow ainda aludiu à carta de Sartre e à resposta com o pedido de reconsideração que entretanto remetera ao escritor. Talvez tenha aludido também ao anúncio, dois dias antes, da Gallimard, a editora de Sartre.
Citada pela imprensa internacional, a 20 de Outubro a Gallimard fez saber que, “por princípio”, Sartre, então com 59 anos, nunca aceitava prémios, “fossem um saco de batatas ou o Nobel”. Depois de já antes ter recusado a Legião de Honra francesa, o escritor, por seu lado, recusou prestar declarações públicas. Nesse mesmo dia, partiu de Paris para Argel, onde ficaria até meados de Novembro. A edição europeia de 21 de Outubro do New York Herald Tribune diz que alguns dos seus amigos estariam ainda a tentar convencê-lo a aceitar o prémio - até por motivos financeiros. Mas o jornal sublinha logo de seguida que não havia qualquer indício de que Sartre viesse a reconsiderar.
O último parágrafo da notícia recorda como, até então, o Nobel fora apenas recusado “em circunstâncias muito invulgares”: “O russo Boris Pasternak foi forçado [pelas autoridades do seu país] a declinar o prémio em 1958. O dramaturgo britânico George Bernard Shaw primeiro anunciou planos de o recusar mas decidiu aceitá-lo após negociações com diplomatas suecos. O pacifista alemão Carl von Ossietzky foi compelido pelos nazis a recusar.”     
Sartre mostrou-se irredutível. E no dia do anúncio da sua vitória fez uma declaração à imprensa sueca que o Le Monde publicou numa tradução para francês revista pelo próprio escritor. Nessa declaração, Sartre explicava como a 15 de Outubro soubera pelo Figaro Littéraire que a Academia teria o seu nome sob consideração e, por isso, decidira contactar Estocolmo, achando que a decisão não estava ainda tomada. “Como expliquei na minha carta à Academia, os meus motivos não se prendem nem com a Academia nem com o Nobel em si próprio”, disse Sartre.
Estranhamente, o Svenska Dagbladet não cita directamente a carta enviada por Sartre à Academia nem explica se ela está disponível e se a consultou. Até à hora de fecho desta edição também não foi possível entrar em contacto com os serviços da Fundação Nobel, encerrados em dia de feriado nacional. A imprensa internacional que trabalhou a partir da notícia do Svenska Dagbladet cita a declaração pública de 22 de Outubro, traduzida para inglês a partir do Le Monde e publicada nos Estados Unidos pela New York Review of Books. Nela, Sartre aponta “dois tipos de motivos: pessoais e objectivos”. E explica que “assinar Jean-Paul Sartre não é a mesma coisa que assinar Jean-Paul Sartre, vencedor do Nobel”.
O escritor, que declarara o marxismo como “o horizonte inultrapassável do nosso tempo”, apontava um exemplo concreto: “As minhas simpatias pelos revolucionários venezuelanos implicam-me apenas a mim, enquanto se Jean-Paul Sartre o laureado apoia a resistência venezuelana implica todo o Prémio Nobel como instituição. O escritor deve, assim, recusar deixar-se ser transformado em instituição, ainda que tal ocorra sob as mais honrosas circunstâncias, como é o caso.”
In Publico, VANESSA RATO 
07/01/2015 - 09:57






Lola




Sem comentários:

Enviar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...