domingo, 23 de abril de 2017

Existência de Deus



Existência de Deus

Ensinar sobre a Existência de Deus


Relativamente poucos filósofos se especializam na filosofia da religião, mas muitos leccionam cursos introdutórios sobre problemas filosóficos nos quais um dos temas usuais é a existência de Deus.A abordagem mais usual consiste em apresentar e reflectir sobre os três argumentos tradicionais a favor da existência de Deus, e então o problema do mal, após o qual a unidade sobre a existência de Deus termina.

O meu novo livro Religion Within Reason (“Religião dentro da Razão”) (Columbia University Press) sugere que esta abordagem muitas vezes incorpora premissas enganadoras que não obstante podem ser partilhadas por alunos e membros do corpo docente. 
Um destes pressupostos consiste na ideia de que se a existência de Deus fosse refutada, então os compromissos de natureza religiosa seriam necessariamente despropositados. Várias religiões, no entanto, rejeitam a noção de existe um Deus sobrenatural. Estas incluem o Jainismo, o Budismo Theravada, o Mimamsaeo Hinduísmo Sânquia, tal como versões “morte de Deus” do Cristianismo e o Judaísmo Reconstrucionista.
Eis, por exemplo,como o Rabbi Mordecai M. Kaplan, um oponente do sobrenaturalismo, responde aos cépticos que perguntam porque é que, se a Bíblia não deve ser interpretada literalmente, os judeus devem ainda assim celebrar o Sabat: “Nós celebramos o Sabat não tanto por causa do relato da sua origem no Génesis, mas sim pelo papel que este ocupa na vida espiritual do nosso povo e da Humanidade… O Sabat santifica as nossas vidas ao ajudar-nos a sermos verdadeiramente humanos, e a transcendermos aqueles instintos e paixões que fazem parte da nossa herança sub-humana.
Consideremos, também, uma das figuras maiores no movimento cristão “Morte de Deus”, o Bispo Anglicano de Woolwich John A. T. Robinson, que nega a existência de um Deus “lá em cima,” ou “além.” Eis a sua interpretação da Sagrada Comunhão: “Demasiadas vezes…deixa de ser uma refeição sagrada, e torna-se num serviço religioso no qual nós viramos as costas ao próximo vulgar e à comunidade e em devoção individualista fazemos a nossa comunhão “com o Deus que está além”. Esta é essência da perversão religiosa, quando a adoração do divino se torna numa forma de abandonar o mundo para “estar com Deus” – mesmo se apenas para receber forças para voltar para ele. Neste caso, todo o reino do não-religioso (a vida) é relegada ao profano.
É claro, uma religião naturalista pode também ser desenvolvida sem ser derivada a partir de uma sobrenatural. Considere, por exemplo, o ponto de vista do filósofo Charles Franke, outro opositor do sobrenaturalismo, que mesmo assim acredita que a religião, quando lhe é subtraída a irracionalidade, pode constituir uma contribuição notável para a vida humana, ao libertar-nos da vaidade e da maldade, e ao ajudar-nos a suportar a tragédia. Como ele diz, “não me parece impossível que a religião possa atrair a aderência genuína e apaixonada dos seus membros sem afirmar ser mais do que poesia na qual as pessoas possam participar e retirar força e luz”.
Tais opções naturalistas são filosoficamente respeitáveis. Escolher ou não alguma delas é uma opção pessoal.
Professores e estudantes devem também reconhecer que o teísmo não implica compromisso religioso. No fim das contas, mesmo que alguém acredite que uma ou varias das provas da existência de Deus são válidas, ainda se coloca a questão de integrar ou não uma religião, e, se sim, qual. As provas não contêm nenhuma informação que nos possa direccionar para qual religião, se alguma, é protegida por Deus.De facto, Deus pode opor-se a toda a actividade religiosa. Talvez Deus não deseje ser adorado, ser alvo de orações, ou até mesmo abençoe aqueles que se abstêm de tais praticas.
E há ainda outro pressuposto enganador implícito nas definições que normalmente são utilizadas: um teísta acredita em Deus, um ateísta não acredita, e um agnóstico nem acredita nem descrê em Deus. Repare também que a única hipótese que está a ser considerada é a existência de Deus na sua concepção tradicional; nenhuma outra alternativa sobrenatural é levada a sério. 
Mas porque não?
Suponhamos, por exemplo, que o mundo é o resultado do combate entre Deus e o Diabo. Ambos são poderosos, mas nenhum dos dois é omnipotente.Quando tudo corre bem, a benevolência de Deus encontra-se numa trajectória ascendente, quando os ocorrem eventos desfavoráveis, a maleficência do Demónio encontra-se em alta.É esta doutrina, historicamente associada com o Zoroastrianismo e o Maniqueísmo, desnecessariamente complexa e portanto desmerecedora de consideração séria? Não, pois, embora por um lado seja mais complexa do que o monoteísmo, porque envolve duas entidades sobrenaturais em vez de um, por outro é mais simples, pois não deixa nenhum aspecto do mundo para lá do entendimento humano.Afinal, o monoteísmo enfrenta o problema do mal, enquanto que hipóteses dualísticas não têm nenhuma dificuldade em explicar tanto o bem e o mal.
Em suma, eu gostaria de sugerir que quer os corpos docentes quer os alunos tenham em mente os quarto pontos essenciais seguintes:
 (1) crença na existência de Deus não é uma condição necessária para entrar em compromissos religiosos;
 (2) crença na existência de Deus não é condição suficiente para entrar em compromissos religiosos;
 (3) a existência de Deus não é a única hipótese sobrenatural digna de discussão séria; e 
(4) uma defesa bem-sucedida do teísmo tradicional requer não só que este seja mais plausível do que o ateísmo, mas também do que todas as outras alternativas sobrenaturais.
Não sugiro, é claro, que não se ensinem as provas da existência de Deus e o problema do mal. Peço, no entanto, que todos os participantes estejam alerta para quais o verdadeiro alcance e consequências das conclusões retiradas dessa discussão.



Steven M. Cahn é Professor Emeritus de Filosofia na City University of New York Graduate Center. Entre os seus livros mais recentes estão The World of PhilosophyExploring Philosophy of Religion, e (com Christine VitranoHappiness and Goodness: Philosophical Reflections on Living Well.

Por Steven M. Cahn



   Tradução do inglês de Pedro Justo.

Muito Obrigado, querido aluno!



                                               Lola

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