sábado, 7 de dezembro de 2019

David Hume e o empirismo



David Hume (1711-1776)


1. Qual a origem do Conhecimento?
  • O entendimento humano é limitado para conhecer;
  • Não há fundamento metafísico para o conhecimento;
  • O conhecimento tem origem na experiência - valoriza o que é conhecido;
  • Crenças e ideias vêm da experiência, até as ideias mais complexas.
2. O que se capta pela experiência?
  • Da realidade o Homem tem percepções - as mais importantes são as impressões;
  • Impressões são: Sensações, emoções, amor, ódio, revolta, paixão e desejo;
  • As impressões representam-se em ideias ou pensamentos;
  • As ideias derivam das impressões;
  • Não há ideias sem impressões prévias - princípio da cópia.
  • Exemplo: A cor do carro é uma impressão sensorial;
  • A memória da cor do carro é uma ideia (que deriva da impressão);
3. O que temos na mente?
  • Temos impressões e ideias;
  • As impressões distinguem-se das ideias pelo grau de força e vivacidade com que as aprendemos;
  • As impressões são mais fortes e violentas do que as ideias;
  • Por impressões, David Hume entende as sensações, emoções, paixões, como quando vemos, ouvimos, desejamos, queremos, amamos ou odiamos; 
  • Para encontrar a diferença entre impressões e ideias basta comparar a impressão visual que temos, por exemplo, da nossa escola com a ideia que formamos dela quando não está presente aos nossos sentidos;
  • A ideia da nossa escola é mais fraca e menos viva do que a impressão;
  • Passa-se o mesmo com todas as impressões e ideias;
  • Para distinguir duas percepções basta comparar os respectivos graus de força e vivacidade para sabermos qual é a impressão e qual é a ideia. 
  • As percepções são mais fortes e mais vivas do que as ideias.
4. Quais os elementos do conhecimento?
  • Para David Hume, há dois elementos no conhecimento: impressões e ideias;
  • Todo o conhecimento deriva da experiência e não de um fundamento metafísico como defendia Descartes.
5. Como se distingue uma ideia de uma ficção?
  • Pela existência ou não de uma impressão;
  • Não há ideias abstratas mas sim particulares com as quais relacionamos outras semelhantes através do hábito.
6. Que tipos ou modos de conhecimento defende David Hume?
  • Hume defende dois tipos de conhecimento:
  • Relação de Ideias: está presente na ciência como a geometria, álgebra e matemática; Todos os conhecimentos da lógica e da matemática apresentam-se como evidentes, analíticos, necessários e baseiam-se no principio da não contradição. - VERDADE NECESSÀRIA
  • Questões de facto: não são objecto da razão humana; Não têm a mesma natureza da Relação de Ideias; Não se baseiam no principio da não contradição; Justificam-se pela experiência sensível e são proposições contingentes pois é sempre possível afirmar o princípio contrário de um facto - VERDADE CONTINGENTE.


Tipos de conhecimento
Relações de Ideias
Questões de facto

São conhecimentos a priori.
A verdade das proposições e a validade dos argumentos não dependem da experiência

São conhecimentos a posteriori
A verdade das proposições que se referem a factos depende do exame empírico

As relações de ideias são verdades necessárias
É logicamente impossível a sua negação

A verdade das proposições de facto é contingente - verdades contingentes

As proposições que exprimem e combinam relações de ideias não nos dão conhecimento sobre o que se passa no mundo – circunscrevem-se ao domínio das entidades abstratas

As proposições que se referem a factos visam descobrir coisas sobre o mundo e dar conhecimento sobre o que nele existe ou acontece
Exemplos

O quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados dos dois lados

Três vezes cinco é igual à metade de trinta

Exemplos

Que o Sol não se há-de levantar amanhã não é uma proposição menos inteligível e não implica maior contradição do que a afirmação de que ele se levantará.




 7. Distinga verdades necessárias e verdades contingentes
  • A negação de uma afirmação acerca de questões de facto não implica contradição alguma;
  • A negação de uma afirmação acerca de relações de ideias implica contradição.

       Exemplifique verdade contingente e verdade necessária.

      VERDADE CONTINGENTE: 
      - Fernando Pessoa nasceu em Lisboa (poderia ter nascido no Porto)
      -  Um pedaço de metal dilatou ao ser aquecido

       VERDADE NECESSÀRIA: 
       - Nenhum solteiro é casado.
     - O triângulo tem três lados (é impossível que um triângulo tenha outro número de lados)


 8. Distinga Conhecimento apriori e Conhecimento a posteriori
  • As verdades contingentes só podem ser conhecidas recorrendo à experiência - são conhecidas a posteriori;
  • As verdades necessárias não dependem de como é o mundo pois mesmo que o mundo fosse diferente em muitos aspectos, continuariam a ser verdades. Nem sequer precisamos de olhar para o mundo para as descobrirmos: são conhecidas a priori.
  • As verdades matemáticas são relações de ideias e não questões de facto pois podem ser demonstradas apenas pelo raciocínio dedutivo, o qual se limita a tirar conclusões a partir de ideias que já temos.
  • O raciocínio usado nas questões de facto é diferente pois trata-se do raciocínio indutivo: observo pegadas na areia e infiro que passou por lá algum ser.
  • Assim, o conhecimento a priori, apesar de absolutamente certo, não é acerca do mundo pois nem precisamos de olhar para ele.
  • Segundo Hume, há conhecimento a priori mas este nada nos diz acerca de como são as coisas do mundo, nem o que existe fora do pensamento - algo que só poderemos saber a posteriori.
  • Todo o conhecimento acerca do mundo (conhecimento substancial) tem nos sentidos a sua justificação.


9. O que distingue as impressões e as ideias simples e complexas?
  • David Hume divide as impressões e as ideias em simples e complexas.
  • As impressões e as ideias simples são indivisíveis, isto é, não podem ser decompostas em mais simples e são, por isso, as unidades cognitivas mais básicas com que a mente trabalha.
  • As ideias e as impressões complexas, pelo contrário, podem ser decompostas em ideias simples e impressões.
  • Por exemplo: a impressão e a ideia de Serra da Freita nevada são complexas, uma vez que podem ser decompostas num conjunto de impressões e ideias simples.
  • A ideia e a ideia de vermelho são simples porque não podem ser decompostas em outras ideias mais simples.
  • Ideias Simples, correspondem a impressões simples, ou seja, impressões de coisas que não podem ser dividas em partes mais pequenas, como a cor ou a forma de um objeto.
  • Ideias Complexas, correspondem a combinações de duas ou mais ideias simples.
  • Estas combinações podem ter origem na Memória, quando apresentam a mesma configuração que tinham quando surgiram na experiência, ou podem ter a sua origem na Imaginação, quando correspondem a combinações inéditas de ideias simples.
  • Através da Imaginação, podemos combinar a forma de um peixe com a forma de uma mulher para criar a ideia de Sereia
10. Como se associam as ideias?
  • David Hume defende que existem princípios que regulam a forma como as nossas ideias se associam entre si. Estes princípios são 3:
  • Semelhança - Exemplo: uma pintura e o original;
  • Contiguidade no espaço e no tempo - Exemplo: uma mesa de sala de aula lembra-nos outras da mesma sala;
  • Relação de causa-efeito - Exemplo: uma queda origina dor.

11. David Hume e o princípio da causalidade

  • "Se afirmamos ter a ideia de ligação necessária devemos encontrar alguma impressão que esteja na origem desta ideia" - David Hume, Ensaio sobre o Entendimento Humano;
  • Para Hume, como para outros filósofos, a ideia de causalidade não é uma conexão necessária, nem um principio objectivo das coisas, mas sim subjectivo pois é fruto do hábito ou costume de associarmos continuamente certos factos a outros e de acreditarmos que o futuro será semelhante ao passado, ou seja, há uma crença na regularidade da natureza;
  • Afirmar “Esta barra de metal dilatou por causa do calor”significa que os nossos sentidos nos mostram que a barra de metal dilatou, mas não que dilatou por causa do calor. Através dos sentidos vemos a barra de metal dilatada e descobrimos que está quente – mas os sentidos não nos mostram que uma coisa aconteceu (dilatação) por causa de outra (calor).
  • A conexão que estabelecemos entre dois acontecimentos é de natureza subjectiva - trata-se de uma projecção do ser humano sobre a natureza. A ideia de causa efeito  não é uma conexão necessária entre acontecimentos e resulta da observação da sua frequente conjunção.
  • A explicação da causalidade não pode ser encontrada na razão, nem nas próprias coisas, mas sim na experiência humana. Não se trata de uma conexão necessária, mas apenas de uma conjunção constante entre eles.
  • As relações causais estabelecem relações de necessidade entre a causa e o efeito  de tal modo que quando a causa ocorre o efeito tem de seguir-se. Por exemplo: O apito do árbitro e o fim do jogo.
  • Prevemos que isto vai acontecer em situações futuras;
  • O princípio da causalidade é o fundamento de toda a investigação científica;
  • É o hábito que fundamenta a causalidade - pois leva a nossa mente a projetar no mundo a ideia de conexão necessária entre acontecimentos.
  • Há uma conexão necessária entre dois acontecimentos quando um não pode ocorrer sem o outro.

12. Como podemos conhecer as conexões necessárias entre diferentes acontecimentos?
  • " Atrever-me-ei a afirmar, a título de proposta geral que não admite excepções, que o conhecimento dessa relação em nenhum caso é alcançado por meio de raciocínios a priori mas deriva inteiramente da experiência, ou seja a posteriori, ao descobrirmos que certos objectos particulares se acham, constantemente, conjugados entre si". David Hume - Ensaio sobre o entendimento Humano;
  • Há dois tipos de conhecimento: apriori - aquele que deriva da razão e a posteriori - aquele que deriva da experiência.
  • Não podemos dizer que tenhamos conhecimento a priori de causa de um acontecimento ou de um facto;
  • Embora Hume tivesse consciência da importância que o Princípio da causalidade teve na história da humanidade, o filósofo vai submetê-lo a uma crítica rigorosa;
  • Segundo Hume, o nosso conhecimento dos factos restringe-se às impressões actuais e às recordações de impressões passadas;
  • Se não dispomos de impressões relativas ao que acontecerá no futuro, também não possuímos o conhecimento de factos futuros;
  • Não podemos dizer o que acontece no futuro porque um facto futuro ainda não aconteceu;
  • Exemplo: Esperamos que um papel, em contacto com o fogo, se queime. Esta certeza que julgamos ter  (que o papel se queime) tem por base a noção de causa, ou seja, atribuímos ao fogo a causa do papel se queimar.
13. Poderemos conhecer a ideia de causalidade?
  • Segundo Hume, não dispomos de qualquer impressão da ideia de causalidade entre os fenómeno
  • Só a partir da experiência é que se poderá conhecer a relação causa-efeito;
  •  É um conhecimento a posteriori e não à priori;
  • Para o filósofo escocês não se pode ultrapassar o que a experiência permite;
  • A experiência é, pois, a única fonte de validade do conhecimento dos factos.
  •  Só podemos ter conhecimento a posteriori
  • A única coisa que sabemos é que entre dois fenómenos se verificou, no passado, uma sucessão constante, ou seja, que a seguir a um determinado facto (A) ocorreu sempre outro facto (B);
  • Acerca do conhecimento de factos futuros possuímos uma crença, uma probabilidade baseada no hábito ou costume.
14. Qual o papel do hábito para David Hume?
  • O hábito leva-nos a inferir uma relação de causa-efeito entre dois fenómenos;
  • Se no passado ocorreu sempre um determinado facto a seguir a outro, então nós esperamos que no presente e no futuro também ocorra assim.
  • O hábito ou costume permite-nos, a partir de experiências passadas e presentes, dirigirmo-nos ao futuro.
  • O nosso conhecimento de factos futuros não é um conhecimento rigoroso , é apenas uma convicção que se baseia num princípio psicológico: o hábito.
  • O hábito é um guia importante para o nosso dia a dia.
  • Como ainda não vivemos o futuro, o hábito permite-nos esperar o que poderá acontecer e leva-nos a ter prudência, cuidado ou boas expectativas.
  • Como seres humanos, temos vontade, criando a ideia de que o futuro seja previsível e, portanto, controlável.
15. O que é o princípio da regularidade da natureza?
  • Segundo a mente associa um fenómeno a outro através do hábito.
  • O que nos leva a pensar que o futuro se pareça ao passado é o Princípio da regularidade da natureza.
  • O que é?
  • Não é uma lei objectiva que esteja na própria natureza mas tal como a causalidade é algo que o ser humano projecta na natureza com base numa regularidade que é sentida por ele.
  • Um exemplo: Se até hoje a água ferveu a 100ºC, é natural que no futuro tal venha a acontecer.
  • Toda a inferência causal assenta na crença de que a natureza se comporta de modo uniforme pois a não existir esta crença a vida seria um caos.
  • A correspondência ou harmonia entre a mente e o mundo deriva do hábito ou costume que é necessário à vida humana.
  • A experiência é mais confiável que o raciocínio dedutivo.
  • David Hume recusa a dedução, valorizando a indução como único processo para conhecer os fenómenos cujo ponto de partida são as impressões.
  • Este conhecimento, no entanto,  não é absolutamente certo mas apenas provável - pois não passa de  uma generalização de casos particulares.

16. David Hume e o problema da indução
·      Para Hume a noção de causalidade é fundamental para o conhecimento dos fenómenos do mundo pois as ciências como a física ou a biologia dependem do raciocínio causal: inferimos causas e prevemos efeitos.
·      A causalidade, segundo Hume, não pode ser diretamente observada, nem pode ser inferida com base apenas na razão – tudo o que podemos dizer é que temos uma predisposição para projetar relações causais no mundo, mas não podemos realmente saber se tais relações causais existem.
·      Relativamente ao raciocínio indutivo (no qual se baseia o conhecimento das questões de facto), Hume vai critica-lo.
·      Sempre que vemos nascer o sol, confirmamos a previsão de que o sol vai nascer amanhã – porque até hoje o sol tem nascido todos os dias.
·      O tipo de raciocínio aqui usado é a indução.
·      Será que podemos confiar no raciocínio indutivo? Que razões temos para pensar que o futuro será como o passado?
·      Segundo Hume só podemos confiar na indução se partirmos do princípio de que a natureza é uniforme e regular, comportando-se sempre da mesma maneira.
·      Justificar a nossa confiança no raciocínio indutivo com base no principio da uniformidade da natureza é ter um pensamento circular.
·      Hume defende que todas as afirmações baseadas no raciocínio indutivo são injustificadas como acontece com as previsões e as formulações das leis científicas (generalização através do raciocínio indutivo)
·      Assim, quase todas as afirmações das ciencias empíricas são injustificadas.

17. Poderemos considerar David Hume um céptico?


·     Afinal, o que podemos saber? Se, como sabemos, as ciencias empíricas se baseiam no raciocínio indutivo e dado que a indução é injustificada, não é correcto afirmar que há conhecimento cientifico da natureza.
·     Segundo Hume, não sabemos se existe um mundo exterior.
·     As conclusões de Hume são cépticas- o filósofo reconhece que é impossível escapar ao cepticismo, muito embora seja impossível vivermos como cépticos.
·     Se na teoria o cepticismo é irrefutável ou imbatível, na prática não poderemos viver como se o cepticismo fosse verdadeiro pois o instinto natural de sobrevivência não nos permite ser cépticos radicais.
·     Há um conflito entre a reflexão filosófica e a prática – nesse sentido, Hume reconhece que o cepticismo sistemático é impraticável.
·     Hume não é um céptico radical. Será ele um céptico moderado?
·     Sim, pois defende que não devemos abandonar as nossas crenças intuitivas acercada existência do mundo exterior ou na existência de relações causais – se abandonamos essas crença, a vida tornar-se-á impossível.
·     Hume defende que o conhecimento dos factos - presentes e passados - é possível através das impressões e ideias ao afirmar que a nossa razão é incapaz de formular leis da natureza de que é exemplo a Ideia de Causalidade.
·     Não é possível alcançarmos a certeza acerca do mundo pois o conhecimento de factos, com base em raciocínios indutivos e em crenças, apenas permite um conhecimento provável.
     A nossa capacidade de conhecimento tem limites  e devemos ser moderados nas nossas opiniões. Devemos estar atentos para evitar o dogmatismo e manter o espírito aberto pois as nossas certezas podem impedir-nos de ver melhor as coisas.  

·     O cepticismo moderado é útil e aceitável pois prepara o estudo da Filosofia.

18. Que criticas apresenta David Hume a Descartes?

  • Hume critica o racionalismo cartesiano pois este apresenta uma dúvida universal que se estende a todos os conhecimentos e faculdades humanas.
  • Se Descartes vê no cogito um principio evidente, para Hume não existe um principio original e não há ideias inatas ou auto-evidentes.
  • Para Hume os sentidos são fundamentais para o conhecimento.
  • Se como Descartes acreditarmos que a dúvida é universal, como entender que da dúvida se possa chegar à verdade?
  • A dúvida sendo tão radical e universal como defendia Descartes não poderá levar a uma dúvida eterna.
  • Segundo Hume não é possível atingir uma duvida universal como defendia Descartes sob pena de esta se tornar incurável e nenhum raciocínio nos puder levar a um estado de certeza e convicção sobre qualquer matéria.
  • Como alcançar a verdade?
  • Começar com princípios claros e distintos;
  • Avançar com passos cautelosos e seguros;
  • Rever, frequentemente, as nossas conclusões;
  • Examinar, minuciosamente, todas as suas consequências...
  • ..." são os únicos métodos pelos quais podemos esperar alcançar a verdade".


"Os filósofos que se dão ares de superior sabedoria e confiança têm uma dura tarefa quando se encontram com pessoas de feitio inquiridor, que os expulsam de todos os cantos onde se refugiam e não podem deixar de acabar por os fazer cair em algum dilema perigoso. O melhor expediente para evitar esta confusão é sermos modestos nas nossas pretensões, e até sermos nós mesmos a apontar as dificuldades antes de elas serem apresentadas como objeções contra nós. Podemos por este meio converter nossa a própria ignorância numa espécie de mérito."

David Hume, Tratados I: Investigação sobre o Entendimento Humano, tradução de João Paulo Monteiro, Lisboa, INCM, 2002, pág. 48.




                                                Lola

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