Um juízo moral – ou qualquer outro tipo de
juízo de valor – tem de ser apoiado em boas razões. Se alguém disser que uma
determinada acção seria errada, pode-se perguntar porque razão seria errada e,
se não houver uma resposta satisfatória, pode-se rejeitar esse conselho por ser
infundado. Neste aspecto, os juízos morais são diferentes de meras expressões
de preferência pessoal. Se alguém diz «eu gosto de café», não necessita ter uma
razão para isso; poderá estar a declarar o seu gosto pessoal e nada mais. Mas
os juízos morais requerem o apoio de razões, sendo, na ausência dessas razões,
meramente arbitrários.
Qualquer teoria adequada da natureza da
avaliação moral deveria, portanto, ser capaz de dar conta das relações entre
juízos morais e as razões que os sustentam. Foi justamente neste aspecto que o
emotivismo fracassou.
Quais eram os pressupostos do emotivismo quanto
a razões?
Recorde-se que para o emotivismo um juízo moral é como uma ordem – é basicamente um meio verbal de tentar influenciar as atitudes e conduta de uma pessoa.
Recorde-se que para o emotivismo um juízo moral é como uma ordem – é basicamente um meio verbal de tentar influenciar as atitudes e conduta de uma pessoa.
A concepção das razões que naturalmente
acompanha esta ideia de base é que as razões são quaisquer considerações que
tenham o efeito desejado, que influenciem as atitudes e comportamentos de forma
desejada. Mas repare-se no que isto significa. Suponha-se que estou a tentar
convencer alguém de que Goldbloom é um homem mau (estou a tentar influenciar a
atitude dessa pessoa face a ele) e essa pessoa resiste. Sabendo que essa pessoa
é um fanático, digo «O Goldbloom, como sabe, é judeu». Isso muda tudo; a
atitude da pessoa muda, e concorda que Goldbloom é um patife. Poderia então
parecer que, para o emotivismo, o facto de Goldbloom ser judeu é, pelo menos
nalguns contextos, uma razão a favor do juízo de que é um homem mau.
De facto, Stevenson defende justamente esta
perspectiva. Na sua obra clássica Ethic
and Language (1944),
afirma: «Qualquer afirmação
sobre qualquer facto
que qualquer interlocutor considere
susceptível de alterar atitudes pode ser aduzida com uma razão a favor ou
contra um juízo ético.»
Era óbvio que algo tinha corrido mal. Não pode
ser verdade que qualquer facto possa contar como razão a favor de qualquer
juízo. Primeiro de tudo, o facto tem de ser relevante para o juízo, e a
influência psicológica não traz necessariamente consigo relevância. (O facto de
alguém ser judeu não é relevante no momento de avaliar a sua maldade,
independentemente das associações psicológicas no espírito de quem quer que
seja.) Há uma lição pequena e outra grande a retirar daqui. A pequena é que uma
determinada teoria, o emotivismo, parece estar errada e, com ela, toda a
concepção do subjectivismo ético fica em causa. A grande está relacionada com a
importância da razão na ética.
Hume sublinhava que se examinarmos as acções
malévolas – «homicídio voluntário, por exemplo» - não encontramos «matéria de
facto» que corresponda à maldade. Excluindo as nossas atitudes, o universo não
contém tais factos. Esta tomada de consciência tem frequentemente sido
entendida como motivo de desespero, porque as pessoas presumem que isto deve
significar que os valores não têm estatuto «objectivo» Mas porque razão deveria
a observação de Hume surpreender-nos? Os valores não são o tipo de coisas que
possam existir como existem es estrelas e os planetas. (Concebido desta
maneira, qual seria o aspecto de um «valor»?) Um erro fundamental no qual
incorrem muitas pessoas quando pensam sobre este assunto é partir do princípio
de que há apenas duas possibilidades:
1. Há factos morais da mesma maneira que há
factos sobre estrelas e planetas; ou
2. Os nossos valores não são mais que a
expressão dos nossos sentimentos subjectivos.
Isto é um erro porque descura uma terceira
possibilidade crucial. As pessoas não têm apenas sentimentos, têm também razão,
e isso faz uma grande diferença. Pode pois ser que
3. As verdades morais são verdades da razão;
isto é, um juízo moral é verdadeiro se for sustentado por razões melhores que
os juízos alternativos.
Assim, se quisermos entender a natureza ética,
devemos atentar nas razões. Uma verdade em ética é uma conclusão apoiada por
razões: a resposta correcta a uma questão moral é simplesmente a resposta que
tem do seu lado o peso da razão. Tais verdades são objectivas no sentido em que
são verdadeiras independentemente do que possamos querer ou pensar. Não podemos
tornar algo bom ou mau pelo simples desejo de que seja assim, porque não
podemos simplesmente querer que o peso da razão esteja a favor ou contra algo.
Isto explica igualmente a nossa falibilidade Podemos enganar-nos sobre o que é
bom ou mau porque podemos estar enganados sobre o que a razão recomenda. A
razão diz o que diz, alheia às nossas opiniões e desejos.
Elementos
da Filosofia Moral, James Rachels,
Gradiva-(Colecção Filosofia Aberta, pp.65-7)
Lola
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